domingo, 19 de agosto de 2012

"Prosa Poética"

  Recentemente li um artigo (encontrável aqui ) que trata sobre o advento da prosa poética (ou o que assim se denomina hoje em dia) na literatura contemporânea. O artigo me fez refletir não sobre a prática de novos escritores (infelizmente o autor não menciona quais o fazem), mas os critérios de se tachar um produto literário de prosa ou poesia, ou hibridamente prosa poética.
  Seria interessante dissecar todo o artigo, ponto a ponto, para seguir as linhas reflexivas do autor Alex, mas me parece que assertivas como "Em poesia os critérios objetivos não existem" ou "poesia é difícil, pelo menos aos que a tentam seriamente, compreendem que frases empilhadas, desconexas e aleatórias, mais que formar um poema, constroem um engodo" não carregam em si grandes explicações. O ponto de maior interesse, e mais polêmico, vem do 6º parágrafo. Aliás, se quiséssemos resumir todo o artigo, esse parágrafo  se prestaria eficazmente à tarefa.
  Nele podemos observar uma espécie de eugenia não-hierárquica dos gêneros (que como o autor acaba por admitir — e parece que à revelia de seu gosto — dissolveu-se junto com critérios "no mundo pós-moderno"). Sim, o fato parece ser lamentado por ele. Essa mistura de gêneros parace resultar apenas em processos improdutivos, cujo principal fim é o de produzir "prosa ruim ou poesia muito ruim". Em suma: prosa poética é um rótulo para encobrir literatura claudicante.
  O maior problema advém do fato de que os critérios estabelecidos por Alex são antes de natureza estética que de "científica", concebendo "estética" aqui como apreciação do leitor, e "científica" como constatação de atributos inerentes de um elemento. 
  Antes de abordar o assunto, convém definir os termos: o que é prosa e o que é poesia? Diante de tais perguntas, o analista mal pode conter sua hesitação. Qualquer definição de poesia claudica por força da natureza do próprio elemento e de uma simples visão diacrônica sobre ele na cultura de vários povos. A prosa também não fica atrás, embora seja "mais simples" (referência ao artigo de Alex). O terreno literário é o terreno das incertezas, e as noções aristotélicas viraram simples parâmetros para entender o que se fez de literário em seu tempo, além de paradigmas destinados a serem superados pelos artistas vindouros. Desde o advento do Romantismo já não é possível mais sustentar a pureza dos gêneros, e essa problemática fica mais evidente quando nos aproximamos de uma definição puramente objetiva (mas certamente não conclusiva, apenas experimental) do que é "poético" e do que é "prosístico".
  Acentuemos certas características do que é poesia: composição que se pauta em versos (ou não), dotados estes de métrica (ou não), rima (ou não) e musicalidade (novamente não, em alguns exemplares concretistas) ; manifesta-se em registros líricos (mas não apenas) com vistas a observar o Eu interior do poeta, do seu semelhante ou o universo que o cerca (além de poder se debruçar em seu próprio "fazer"). O nível sintagmático não é definitivo em sua leitura, e nela podemos encontrar tanto trechos argumentativos como descritivos.
  A prosa: composição que se pauta na concatenação de períodos, orações, frases ou parágrafos onde os verbos são recorrentes (ou não: vide Circuito Fechado, de Ricardo Ramos) para a criação de um mundo ficcional.
  Usemos também da semiótica, embora sem a perícia própria dos pensadores desse campo, para abordar a questão.
  Tanto a prosa quanto a poesia tem grande carga de símbolos. A ordem em que o artista dispõe os elementos na oração (ou frase) podem resguardar significações tão amplas quanto as de um verso. Entretanto, a prosa tende (em minha leitura) a se manifestar preponderantemente na instância da terceiridade, onde a concatenação de ideias cria um fluxo de significados. A poesia, embora se manifeste na instância da primeiridade (mais propriamente o qualissigno), também resguarda, em algumas obras, grande carga de terceiridade (penso nos versos de Caso do Vestido, ou mesmo em alguns trechos de poemas épicos e canções de gesta). Na prosa (como no artigo as reminiscências a Joyce e Rosa fazem bem em lembrar) as fronteiras entre oração e verso se dissolvem. As ruminações intrincadas de Stephen Dedalus no primeiro arco de Ulisses não são mero fluxo de consciência — tentativa de materializar os processos psíquicos de um ser: são também poesia.
   Agiria bem um artista, com vistas a respeitar os preceitos aristotélicos, a evitar certos procedimentos próprios da poesia, se escreve prosa? Penso que não. Respeitar velhos paradigmas não viabiliza novas formas. É preciso lembrar que a poesia passou por metamorfoses, afastando-se do acompanhamento musical que a caracterizava. Numa visão ainda diacrônica, em certo ponto da história (é preciso lembrar que ainda no Trovadorismo a "poesia" era essencialmente oral), prosa e poesia passaram a compartilhar de certos atributos: a poesia também era composta para ser "vista". Sem tal metamorfose, nunca haveria o advento do poema concreto. O tópico do argumento desse parágrafo é que as mudanças são constantes no terreno literário; não seria a "prosa poética" o resultante dessas mudanças?
  A título de ilustrar minha posição, reproduzo abaixo um trecho do conto de Wítalo Lopes Moreira, denominado O Rapaz e a Velha:

  "Não conte que com isto conto. Tudo é matéria nesses chão. E quem há que não tem a sua prosa? A vida é mote, meu senhor. E como diria o sábio ancião: 'Então glosa!'.
  Não me fiz rogado, glosei. E aí vai meu bocado:
  Lá por meio desses mato, escondido atrás do morro - só mato e morro - é que morava senhor novo, marrudo, troncudo e calado. Vivia lá no seu pedaço quadrado de terra, tinha casa de barro amassado, teiado de palha, e, credite que sim, uma velha.
  Er'os dois só nesta vida: sofrida a danada na raia e o maldito da carpina. Cada qua'o fado exalava: a velha: fumaça de lenha do fogão estorricado - com aroma de feijão. O rapaz: suor azedo de mato com folha de laranjeira.
  Mal eu não visse naquele vivêsse todo, mas contece que num disse que... direi tardamente.
  Cuspo já, não somente, que os dois era parente. Se filh'ou mãe, tia, sobrinho, neto ou avó? Lhufas! E nem cabe cá fuxiquice. Cuidemu'apenas do caso. Se acaso não é de descaso...

  No trecho acima estamos diante sem dúvida de um texto em prosa: predominância da narrativa alternada entre comentários do narrador e descrição, orações que se relacionam logicamente, etc. No entanto, temos também elementos próprios da poesia: rimas internas (deveríamos chamar de "ecos"?) que se unem ao ritmo frasal — recurso que os manuais de boa escrita e gramáticas prescritivas deplorariam; relações lúdicas entre palavras que incluem uma semântica movediça ('só mato e morro", "fado", "a vida é mote, meu senhor") e polissemia.
  A despeito da evidente influência rosiana, cabe perguntar: o hibridismo de formas produziu aqui uma "prosa ou poesia ruim"? Não nesse caso, se o leitor me permiti opinar. O autor do trecho mergulha sem hesitações nos recursos rítmicos e sonoros próprios da poesia. Sempre considerei estéril o culto ao ritmo na prosa. Por força de seguir as cadências que o autor impõe, dispersamo-nos do conteúdo ficcional bem como das relações lógicas das orações, porém aqui o recurso se justifica plenamente pela relação da forma (ritmo da prosa) com o conteúdo (ritmo oral inerente à fala do interiorano).

  Como já mencionei neste post, o terreno literário é o das mudanças constantes, e não por força unicamente de vanguardas. Todo grande artista reinventa as fórmulas com as quais trabalha. A distinção a ser criada então é a de quem opera as mudanças de forma funcional, sem alardear "uma erudição que não possui", ou tampouco se entregando à exercícios estéreis, mas buscando alcançar o nível de precisão mais alto com a lente que optou por utilizar, mesmo que está mescle diferentes graus.

58 comentários:

  1. Daniel,

    Minha intenção explícita no texto é comentar justamente esta moda genérica da “prosa poética” e mostrar como o rótulo, que os próprios autores dão a si é uma desculpa para um texto que não se sustenta nem na idéia e nem na excelência da forma, uma etiqueta que visa evitar o debate da propriedade de um texto. Quem pousou os glúteos em uma cadeira para escrever, e se o fez de forma consciente, chegou a uma conclusão simples, uma escolha, forma ou conteúdo. Priorizando-se forma conteúdo sofre e o inverso também é verdadeiro, no extremo a forma elimina o conteúdo, e se pretende conteúdo perde-se a liberdade na busca da melhor forma. É uma escolha de prioridades, e quem não se bateu com este dilema, nunca ousou escrever de maneira consciente.

    A escolha entre forma e conteúdo, não é estética, mas constatação prática, se quiser dizer científica, temos que aí colocar um método, uma hipótese que se permita falsificável, assim se um texto pode ser melhor escrito subtraindo-se parte da forma, como é o caso do que postou, temos aí prioridade de forma. A menção a Aristóteles é fortuita, pois é o exemplo cabal de como um texto de excelência pode ser usado de forma estúpida, tem mérito, mas quando usado como dogma pela igreja, o Organon tornou-se peça de opressão. A leitura da “Poética” traz alusões atemporais sobre a natureza da escrita e colocar estas em um passado a ser esquecido ou dogma a ser seguido, é atitude derrogativa do pensamento independente. E se conhece um pouco da natureza destes textos, sabe que a forma escrita não é própria da sua natureza, mas os restos destes ensinamentos que chegaram a nós.

    Não está na natureza do meu texto classificar prosa ou poesia, mas colocar as prioridades objetivas que norteiam o ato de escrever, priorizar a forma, ou o conteúdo, e é aí que entra a “prosa poética” que por não priorizar nada, não tem nem excelência em forma e nem em conteúdo, é só ver o texto que postou, prioriza forma, de maneira explícita. São suas próprias definições que não o coloca como poesia, mas minha alusão é clara, há inegável prioridade de forma. Para citar um exemplo, ainda mais claro, está aí “O Corvo” de Poe, obviamente um poema, prioridade de forma, mas também expressa uma estória, a prioridade foi a forma não o conteúdo, mas há inegável conteúdo.

    Neste cenário o rótulo auto-imposto prosa poética é apenas um cobertor da mediocridade, se não cito exemplos é para que os próprios autores que assim se classificam sintam-se incomodados a pensar sua escrita que se furta à análise do próprio escritor, sem cobrar-se por qualquer tipo de excelência. É fácil ver por aí as legiões que se escondem sob esta bandeira, e infelizmente é apenas uma máscara para incompetência textual. Inexiste o debate profundo no mérito de qualquer escritor, apegam-se a estes “memes”, bandeiras de propaganda para evitar qualquer debate que possa trazer a visão consciente para a questão.

    “Prosa poética” é bandeira da inconsciência, falta de critérios e crítica, é uma marca para furtar-se ao entendimento da escrita e de seus méritos, mesclando o bom e o ruim, pois sem entendimento, o desleixo traveste-se de genialidade, pela falta de objetividade advinda da visão não crítica do leitor.

    Se alguém pretende escrever e ter domíno sobre o meio é preciso abandonar estas muletas e esquecer o misticismo, pois no papel, seja prosa ou poesia, forma ou conteúdo, o texto carece de escolhas objetivas, educadas e calculadas.

    Alex

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  2. O que não está presente no post que publiquei sobre demais partes de seu texto representa minha confluência com sua visão. Concordo que há muitos que utilizam rótulos como espécie de escudo narcisista para ocultar suas deficiências, e isso não é monopólio da "prosa poética". Quantos não se taxam de pós-modernos, retrógrados, vanguardistas, etc., para ocultar certos descaminhos que optou?
    Entretanto, cabe perguntar: a prosa poética existe?
    Parece-me que sua análise vai de encontro a esses presumidos e narcisistas... Mas a pergunta é: ela aborda a questão "existe prosa poética"? Acho que responder essa questão não foi o que você teve em mente.
    Isso se dá justamente no fato de no texto você não ter a preocupação de "classificar prosa ou poesia", sem o que não poderíamos responder satisfatoriamente a pergunta "existe prosa poética?"
    Por isso mesmo coloquei a distinção da abordagem estética e científica.
    Vejamos: na primeira, analisamos o exemplar e constatamos se ele é bem sucedido em seu hibridismo. No segundo, agimos qual o médico que aborda os elementos presentes no corpo tomado por uma patologia, analisando friamente de que natureza são, e tentando chegar a uma conclusão da moléstia, independente se o enfermo é seu desafeto. Veio-me à cabeça tal dicotomia lembrando dos desencontros nos cursos de Letras entre os pesquisadores linguistas e seus companheiros de teoria literária. Os primeiros tacham os segundos de "impressionistas", não conseguindo sustentar uma posição com o mínimo de cientificidade.
    Aplicando a uma obra de "prosa poética": o esteta irá avaliar a validade qualitativa que surgiu do hibridismo de formas; o pesquisador científico de fenômenos literários irá analisar no texto em prosa que a recorrência de rimas é de natureza poética, bem como certos fenômenos semânticos, etc.
    Irá concluir, sem interesse do resultante qualitativo, que o trecho pertence a "prosa poética".
    Sobre o trecho de seu comentário "E se conhece um pouco da natureza , sabe que a forma escrita não é própria da sua natureza, mas os restos destes ensinamentos que chegaram a nós.", confesso que fiquei em dúvida se a natureza se refere a meu conhecimento da poética de Aristóteles ou dos exemplares mal sucedidos de prosas poéticas.
    Como em minha primeira impressão foi a primeira, devo dizer que não me vejo como especialista aristotélico (e devo confessar que não quero sê-lo). Minha leitura dele, e o argumento que usei, veio da constatação de que se os preceitos de sua Poética tivessem TOTAL validade, não teríamos (ao menos na forma que conhecemos) os dramaturgos elisabetanos; não concordo sobre o que aponta da relação entre o Drama e o Épico, e seu conceito de mímesis não é uma unanimidade... Mas claro que o referido texto "traz alusões atemporais sobre a natureza da escrita", caso contrário não perduraria tanto no tempo e espaço, não seria relevante... Agora o uso que fizeram da Poética (e que eu não fiz) já é outra coisa, inclusive suspeito que se Aristóteles ainda estivesse vivo não teria mantido a Poética do jeito que a conhecemos (ou que nos chegou mutilada).

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  3. (continuação)
    O que conclui de sua leitura (o que ela me acrescentou) é a imperícia daqueles que se lançam, temerários, na corda bamba entre Prosa e Poesia, âmbito em que poucos conseguem se equilibrar (Joyce e Rosa são alguns deles — aliás, você concorda com essa assertiva?).

    Através do seu comentário, aliado ao texto que escreveu e abordei, confesso que fiquei incerto sobre sua concepção. No comentário que agora respondo você fala "Priorizando-se forma conteúdo sofre e o inverso também é verdadeiro, no extremo a forma elimina o conteúdo, e se pretende conteúdo perde-se a liberdade na busca da melhor forma"; mas o problema que você coloca (a imperícia dos que não optam pela melhor forma ou pelo melhor conteúdo) me parece que não é propriamente do terreno da "prosa poética". No conto que escrevi, a forma Laudo Pericial nada tem de poética, assim como o mesmo ocorre com a forma dialógica adotada em Memórias do Subterrâneo... Em ambas podemos ver a questão forma/conteúdo e se as escolhas foram bem feitas; sobre isso, não estamos falando necessariamente sobre "prosa poética".

    A questão, caro Alex (repito-o), é: existe "prosa poética"? O Quintana's Bar de Drummond é prosa poética? Ou poema em prosa? E "O grande desastre aéreo de ontem", de Jorge de Lima?

    Gostaria de saber sua opinião sobre a qualidade do trecho O rapaz e a velha (pois já me disse que o ele privilegia mais a forma) e, a partir disso, analisarmos a questão em torno dele.

    No mais, ficamos assim...
    D.

    P.S.: O "misticismo" presente no comentário no me pareceu fora do contexto DESTA discussão...

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    1. Daniel,

      Lhe pergunto: No desvanecimento da forma, faz sentido criar uma nova chamada “prosa poética”? Não critico a queda dos antigos dogmas, mas a total falta de critérios devido à ignorância. Se a fase primeira dos modernistas contou com escritores plenamente cientes dos autores que os antecederam, a fase tardia do movimento perdeu qualquer erudição e louvou o novo, a ignorância e a falta de critérios, e infelizmente esta terra arrasada é o que sobrou no pós-modernismo contemporâneo. No Brasil a coisa é ainda um pouco pior, tivemos um modernismo estereotipado, copiado da fase tardia mundial, em vez de grandes autores individuais, estofo do qual a literatura é feita, tivemos literalmente uma moda, repercutindo apenas a mediocridade dos estereótipos modernos, mas sem a excelência individual. João Cabral em seu texto de quarenta, um dos poucos que fla de literatura, diz que a poesia era extremamente popular, e os critérios poéticos passaram a ser norma também na prosa, equívoco e crime, e pode explicar um pouco desta estupidez que temos hoje. Não há país onde a poesia foi tão mistificada como o Brasil, e não há país com critérios tão ignorantes para avaliar sua poesia. A prosa poética é uma bandeira dos incompetentes de passarem o mal entendimento da poesia para a prosa.

      Sou bastante prático, se não sentou para escrever e percebeu o compromisso com forma ou conteúdo, não chegou a pensar sua escrita. Exemplos extremos de escrita como os de Gertrude Stein e Joyce em “Finnegans Wake”, nos mostram os limites, fronteiras onde a escrita desaparece; Gertrude aboliu o tempo, nada sobrou; Joyce grande parte da herança, criou um texto de gueto, o menor deles. São experiências válidas quando inéditas, mas indignas e repetição.

      Quando me refiro à natureza dos textos aristotélicos, refiro-me ao fato de que eles não foram feitos para serem lidos, comunicados por livros, mas por mestres em uma longa tradição oral, assim, os considere apenas como “guias do professor” incompletos, devendo ser complementados pelo entendimento do mestre e a discussão dos alunos. Livros na época eram raríssimos.

      Se quer escrever poesia, conheça as antigas regras, não apenas corra na ignorância e saiba o motivo de viola-las, em prosa conheça a retórica, saiba seus motivos e quando os violar, na dissolução das formas não precisamos de novas, mas de entendimento sem dogmas, “prosa poética” é um arremedo como o “samba rock”, o “pagode metal” e o “sertanojo clássico”, o que são as Sereias de Joyce e a prosa de Fitzgerald? Faz sentido um novo rótulo a evitar o entendimento? Fitzgerald entitulou-se prosopoeta ou apenas escritor?

      Abraço,
      Alex

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  4. Caro Alex,

    Em sua afirmação “desvanecimento da forma”, devo entender a conquista louvável advinda do advento do modernismo, ou o processo diluidor levado a cabo pelos “prosopoetas”? Considerando a primeira hipótese, o desvanecimento da forma levado a cabo por obras vanguardistas como Ulisses não trouxe o abandono à boa e velha forma de narrar (com algumas modificações, claro) praticada por Hemingway, Steinbeck, Faulkner, etc.; se a segunda hipótese é o que conta, a existência de Verdadeiros prosopoetas como Joyce e Rosa não diluiu as formas, mas sim os seus seguidores o fazem.
    Pelo que pude entender de seu sistema, Alex, perscrutando alguns textos que escreveu e tecendo entre eles uma linha condutora, é que sua ênfase está mais no praticante no que na prática, o elemento em si. Trechos tais como “critico (...) a total falta de critérios devido à ignorância”, “o rótulo auto-imposto prosa poética”, “incompetência textual”, etc., voltam-se antes aos maus escritores (geralmente os contemporâneos) que ao fenômeno Prosa poética. Esqueçamos eles, e a iniciativa de se autoproclamar um prosopoeta, e analisemos: a prosa de Rosa e Joyce é meramente prosa, ou podemos encontrar elementos de poesia? Não importa como eles se intitulavam, apenas o resultante de seus esforços...
    Quanto a sua afirmação sobre o modernismo brasileiro, estou de pleno acordo. Os escritores brasileiros pareciam entusiasmados porque, em plena era do Playstation 3, haviam descoberto o nitendinho, e estavam se divertindo a valer com a descoberta. No entanto não sei se há misticismo em versos como “há poesia no amor, na flor, no elevador”, de Oswald, ou em “poesia, te escrevia/ (Flor!) sabendo que és fezes/ fezes como qualquer”, de João Cabral.

    Sobre o “auto-entitular-se” de Fitzgerald ou Joyce... Sigo o lema: “confie na obra, não no autor”. Olho para Ulisses e Grande Sertão: Veredas e não vejo unicamente prosa.

    Insisto para que abordemos a validade do trecho que postei para contextualizarmos nossa discussão...

    Abraços,
    Alex.

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    1. Daniel,

      Se os modernistas pareceram grandes violadores, nada perpetraram que os escritores precedentes também não fizeram, que foi exatamente violar o que já existia para criar o novo, o seu jeito pessoal de escrever. Desvaneceram as formas, os dogmas, mas proibiram o passado de forma ditatorial, hoje abraçamos a liberdade da forma, e apenas a pertinência em um texto deve ser levada em conta. Não faz sentido outra definição inútil para acobertar a liberdade escrita.

      Minha ênfase é o ato escrever, seja como idéia ou como prática, colocar o pensamento na questão e fugir da ignorância mítica, um ponto crítico em relação ao marasmo dominante. Existe uma realidade que quem senta para escrever de maneira consciente sabe, forma ou conteúdo. Não faz mais sentido no momento que as formas desapareceram classificar de acordo com as antigas formas: “bom, este texto é 73,33% poesia, o resto é prosa; já este outro é 65,43% prosa, com 31% de elementos poéticos e o resto indefinido”. Não lhe parece ridículo?

      O texto que postou, se tirarmos a forma é absolutamente inútil, assim, o autor preferiu a forma ante o conteúdo, foi a escolha, neste trecho, o conteúdo sem a forma é nulo. Não faz sentido prosa ou poesia quando as formas não mais existem, mas o dilema entre forma e conteúdo é real no ato de escrever.

      Entre prosa e poesia a maior ignorância está no entendimento da poesia, é esta falta de critério que querem aplicar ao texto, e assim fugir do entendimento. O rótulo prosa poética, inútil no mundo sem formas, é assim, apenas um “meme” da ignorância, para desculpar textos sem entendimento nem excelência sonora, o rótulo para esconder o nada.

      Abraço,
      Alex

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  5. Olá, Alex

    Concordo com sua assertiva sobre os grandes criadores. Shakespeare por exemplo não escreveu teatro como o fizeram seus antepassados de ofício gregos. Também misturou tons cômicos com trágicos. Ainda sim, nossa história reconhece como verdadeiros demolidores escritores como Joyce. Eis aí um elemento que vale um estudo mais detalhado.
    O pensamento que me incomoda é a proclamação do “desvanecimento da forma”. Como disse, após Joyce veio Steinbeck, por exemplo, e sua prosa não me faz claudicar em minha percepção: é a prosa mais tradicional. Já quando olho para Joyce (trechos de Ulisses, e não os contos Dublinenses), minha percepção falha. Fico a meio caminho.
    Realmente é ridículo planilhar ou fazer um gráfico em que se conste o nível de porcentagem dos elementos constituintes de uma obra, e nem eu sugeri isso. O que quis dizer é que no trecho postado, o autor (que inclusive não se autonomeia prosopoeta) utilizou de um recurso condenado pelos meios “oficiosos” da escrita e não hesitou em colocar rimas internas em seu texto, por exemplo. Este é um exemplo de texto que me faz novamente claudicar em uma definição.
    Você deplorou tal efeito? Pois bem, é o seu gosto. Mas essa deploração veio somente do fato da inconsistência do conteúdo ou veio da prática do hibridismo? Se sua posição é praticar prosa como ela é, defendendo a separação de métodos, pois no que diz respeito ao meu conto você afirmou “Você está tentando expressar o texto através da forma, deixe isso para a poesia”, então quer dizer que não houve um “total desvanecimento da forma”. A forma prosística e a forma poética ainda resguardam características que não devem se misturar (segundo sua opinião). Assim, não se desvaneceram e não se confundem. Há em nós uma competência que faz, diante de um texto, dizer: “é conto”, “é poema”:
    “Não faz sentido prosa ou poesia quando as formas não mais existem”

    Tire-me uma dúvida: acha possível você deparar com uma produção literária, um conto, por exemplo, em que haja rimas e polissemias na palavras, e ainda sim ter uma qualidade acima da média? Um texto, em suma, que se equilibre com habilidade na berlinda dessas duas naturezas?

    Abraço,
    D.


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    1. Daniel,

      Sinto que estou perdendo meu tempo, uma vez que não se dá ao trabalho de ler o que escrevo, mas de tirar frases de seu contexto, releia:

      ”Percebi a métrica, e foi o que me incomodou, pois no ritmo da prosa, o pior pecado, ou o que não funciona, é métrica, se não me engano isto foi notado até por Aristóteles. Há um nível maior de complexidade no ritmo da prosa que torna qualquer métrica derrogativa, a prosa pode ser tudo, menos métrica, torna previsível; o que mantém a atenção na prosa é a surpresa, a métrica cria um “arrasto”. O André Vianco é um autor que segue a risca os manuais de redação e (falta de) estilo, só usa frases curtas, seu texto é um saco, sempre com o mesmo ritmo, pam, pam , pam ,pam, pam, mesmo sem saber, ele insere uma métrica, é impossível de ler, irritante. Você vai encontrar partes métricas em Guimarães Rosa, mas são exceção, e assim acrescentam à diversidade de ritmos da prosa.”

      Será que não fui claro? Não faço citações retóricas e fundamento minhas afirmações, não debato por esporte.

      Vejo todos os elementos textuais apenas como ferramentas para um objetivo, cada escritor priorizou elementos em sua escrita, tornado-os efetivos dentro de sua narrativa, elementos funcionam ou não, dentro do contexto, não das antigas formatações, e entender isso é o passo adiante, com mais elementos antes creditados à poesia, a prosa do Kipling é efetiva, e não é prosa poética. Não existe justificativa para o rótulo prosa poética que não seja furtar-se ao julgamento objetivo que não é praticado na poesia por estupidez mística.

      Abraço,
      Alex

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  6. Caro Alex,

    Não vamos polemizar. Entendo seu ponto de vista, apenas não concordo. Mas não discordo por esporte. Leia meu post e se fie nele, se optar por perder um tempo, desconstrua-o e aponte suas incongruências. O produto final está ali, cabe a qualquer leitor discordar ou não do que argumento. Se escolhe perder tempo ao fazê-lo, e um diálogo se estabelece, foi um tempo ganho. Se não, ficamos no ostracismo da blogosfera. É a liberdade do leitor e nenhum blogueiro deve ficar mendigando atenção pela prática do escambo. Relação onde não cabe qualquer afetação. Sim, li com o maior respeito tudo quanto escreveu (e comentei — aliás, se reparar, verá que os adjetivos são escassos) e é por isso que estou fazendo o que faço agora.
    Se você não faz citações retóricas, tampouco eu o faço. Não o leria se achasse maçante ou pernóstico, e nem você o deve fazer. A minha relação com o que leio está no que escrevo, . Você disse deplorar Milton Hatoum, o que não evitou que ele fosse aclamado. É sua relação com Hatoum. Se todos concordassem, não haveria avanço.

    "VEJO todos os elementos...", assim você iniciou seu derradeiro parágrafo. Pois bem, como escrevi no EbookBR: "Apertemos a mão, e fiquemos assim".

    Abraço,
    D.

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    1. Daniel,

      Se não entendeu, minha visão é uma crítica a este marasmo literário que impera, quando um escritor medíocre, como o Hatoum, não é percebido e aclamado como o melhor escritor brasileiro estamos no fundo do poço. E isto acontece pois não temos cultura para analisar a excelência textual, e isto na literatura que se diz culta, não dá para ver tanta diferença do Harry Potter. Há o debate entre os “Granted”, representantes desta escrita medíocre e estereotipada, e a geração zero, se é assim que chamaram a coletânea para contrapor-se à granta, mas veja que interessante, fora desta dicotomia entre Paulo Coelho malhando Joyce e os “literários”, não existe qualquer debate qualificado, acusações e mais nada, ninguém abre seu texto à análise, nenhum julgador expõe os seus critérios de escolha, não há debate aberto que possa esclarecer a questão e educar o leitor, apenas ignorância de ambas as partes. A prosa poética é parte deste cobertor de ignorância, e se tivesse lido o trecho que já havia postado, veria que não fazia sentido citar meu texto fora do contexto da discussão, afinal, está mais que explicado o motivo de eu dizer para “deixar a forma para a poesia”. Mais de cem anos pregou-se a dissolução da forma, acho válido, também acho que deve-se abolir a proibição da forma, uma vez que não há mais formas fixas, na dissolução todas são válidas, e isto contribui para o maior entendimento da escrita, quando criam novos rótulos, novas formas artificiais, para encobrir mediocridade acho ridículo, um passo para a ignorância.

      Abraço,
      Alex

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  7. Olá, Alex.

    Posso estar errado, mas do início do parágrafo ao primeiro ponto, após a palavra "poço", estão duas ideias que havia pinçado aqui, a saber: "a degeneração cultural que se acentua conforme o passar do tempo" e a ênfase nos praticantes das "formas". É preciso esmiuçar: Se Hatoum hoje é aclamado como melhor escritor brasileiro mesmo não sendo é porque já se foi os tempos de ouro quando tínhamos Clarice, Rosa, Drummond, Cabral de Melo Neto, etc. É nesse sentido que estamos (também) degenerando.
    Também eu havia lido o que Coelho disse de Ulisses e a repercução gerada em âmbito internacional. O que você achou disso tudo e da posição de Coelho?
    Realmente, além disso, debates sobre literatura contemporânea só os que temos em blogs e afins.
    Não sei se a moda literária "prosa poética" foi criada, ou se foi fenômeno oriundo da prosa Rosiana, Joyceana e Clariciana. Coloquemo-nos no lugar dos modernistas: Sim, é preciso make it new... Mas como? Dissolução da forma. Sim, mas até na destruição deve ter algum método... Qual esse método? O das vanguardas? Ou será que o caminho foi o de entrelaçar os fios da prosa e da poesia?
    Caso o termo "prosa poética" tenha sido inventado, a quem deveríamos acusar pelo feito duvidoso?
    Sobre o tirar sua frase do contexto... Acho que uma forma válida de se policiar (eu mesmo o faço) e sabendo se as afirmações ou constatações que temos se prestam a todos os campos de nossas ideias. Por isso citei um trecho de outra discussão. Acho até que é um ato de respeito uma vez que está implícito no ato a nossa consideração ante as reflexões (e os textos que a materializam) da pessoa.
    Afirmei, por exemplo, que considero a Arte algo mais real que nossa própria relação com a dita "realidade". Quando o afirmei, expus-me ao seu escrutínio, além do meu próprio. Será que eu seria capaz de sustentar essa tese no terreno da música? E no do cinema?
    Se entendeu o parágrafo acima, entendeu a bússula que me norteia, e também porque sou mais de levantar hipóteses que afirmar axiomaticamente.

    No mais, satisfaz-me o retorno ao tom sereno que caracteriza nosso diálogo. É sua principal característica (e qualidade).

    Abraços,
    D.

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    1. Daniel,

      O Paulo Coelho é apenas um idiota ignorante, comentar as besteiras que diz não faz sentido, mas ver que do outro lado não apareceu alguém capaz de dizer o motivo de Ulysses ser o que é além de uma obra aclamada é que me preocupa, o pseudo mago é “aclamado”. Posso afirmar com certeza que muito do que chamamos modernismo literário hoje, veio como reação a Ulysses, a primeira reação de ultraje que teve Virginia Woolf ao ler a obra é deliciosa, pois em certo sentido, é puro exibicionismo estilístico, um escritor ao ler pensa: “está aí um gajo que quer mostrar que sabe escrever, em um mesmo livro desfila vários estilos, todos impecáveis”. Se você ler ensaios da época não vai ver quase nada deste estereótipo modernista que conhecemos, esta classificação só surgiu muito depois, nem era a preocupação dos pioneiros modernistas a dissolução da forma, leia seus ensaios e verá, estão apenas preocupados com a literatura, feita por caras como Victor Hugo, Goethe, Dickens e muitos outros. Como seus antecessores, eles se preocuparam em escrever do seu jeito, apenas isso, e a obra de Joyce foi seminal em definir o rumo da literatura futura, mas veja sua trajetória, de algo muito simples como “Dublinenses”, até o extremo do nada de “Finnegans Wake”. Todos falam de “Ulysses”, que é uma obra fácil de ler, cheia de hermetismos e com um final estranho, mas sem querer entrar em todo simbolismo é uma estória fácil; ninguém cita a última obra. Ilegível! Bem... quase. Ulysses não cabe em cento e quarenta caracteres, como nenhuma grande obra cabe, dizer isso é pura ignorância, para entender “Ulysses” é preciso vivenciar dezesseis de junho de 1904 sob os olhos de Joyce, algo além disto, é apenas burrice crônica, e ouso dizer mais, só vai ter o entendimento completo na língua nativa, fato comum com grandes escritores.

      Muito do que podemos chamar de modernismo tardio existiu como reação a Ulysses, tal foi seu impacto na literatura, pois ao entrar no espírito da época da virada do século, para a maioria dos ensaios, modernismo nem existia; foi um nome que englobou muito dos conceitos da pintura, e na literatura os “modernistas” originais nunca preocuparam-se com estas besteiras. Já acho a própria definição de modernismo pejorativa e irreal, imagine “prosa poética”, um arremedo de nada. Quando se lê “Heart of Darkness” do Conrad, o que temos? Alguém preocupado em fugir de formas ou apenas escrever? Fala, escreve sobre um sentimento indizível, e foi bem sucedido, perto dele os trabalhos iniciais de Woolf e Joyce não seriam primários? Quem tem escrita mais “moderna”? O grande erro “modernista”foi tentar seguir a fórmula do sem forma, criando a regra do sem forma, uma nova forma.

      Em relação à frase fora do contexto, você usou métrica no seu texto, expliquei o motivo de não funcionar, e por isso disse para esquecer a forma e deixa-la para poesia, é sobre métrica, no contexto da discussão que estávamos falando. Escrever bem é unir forma e função, dependendo da prioridade, sabe-se o lado que vai; todos grandes escritores uniram forma e função, simples assim, de uma maneira única, por isso sou tão avesso aos estereótipos historicistas, pois como disse, explicam muito bem toda mediocridade literária, mas falham magnificamente em perceber a excelência.

      Não gosto de levantar hipóteses que meu cérebro já coloca de lado ao mínimo escrutínio lógico, fico com as hipóteses que podem seguir adiante e talvez virar paradigmas; razão e lógica são coisinhas interessantes, nos permitem olhar o interior das estrelas sem nunca lá podermos chegar.

      Abraço,
      Alex

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  8. Daniel,

    Olhe o nível do debate que está por aí:

    Escrever é apenas narrar?

    O único que falou algo que presta foi o Rubens Figueiredo, e de forma tímida, veja como quase foi massacrado, detalhe... no final não houveram perguntas...

    Abraço,
    Alex

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  9. Caro Alex,

    O termo "modernismo" tem suscitado realmente muitas controvérsias. Bloom mesmo afirma que "cada época tem seu modernismo", querendo talvez dizer que em todas as épocas os gênios operam transgressões na corrente literária vigente. Mas penso que os ditos "modernos" tem uma consciência mais ampla do que os precedentes no que diz respeito às transgressões de forma. Antes de Joyce, não enxergamos (salvo engano meu, mas li bastante dessa literatura) autores que transgridem para além dos gêneros literários. Quando abrimos Ulisses vemos partituras, o maravilhoso estilo catequético, etc. Gêneros que vieram de outras paragens que não as literárias, e o mesmo podemos dizer de um John dos Passos, por exemplo. Em suma: experimentaram para além dos limites do âmbito literário, que é o que parece ser o ideal que o escritor Joca Reiners, no link que gentilmente me indicou, reivindica com tanto afã (e note-se que essa prática já grassa de desde o início do século passado!).
    Quanto a prosa poética, sem insistir muito na questão, a minha visão é científica: abordo o espécime e mapeio os elementos nele constituintes. "Isso é recurso recorrente na prosa, isso é de poesia". No extremo, podemos dizer NÃO ao rótulo "prosa poética", que nos soa desagradável ao ouvido. Mas podemos observar experimentações, como as que ocorrem no trecho do conto que coloquei nesse post, e avaliar seu resultante (como você fez), COM CRITÉRIOS ESTÉTICOS.
    Retomemos o trecho do meu conto: Não o considero prosa poética, entretanto utilizo um recurso recorrente da poesia para conseguir o efeito que almejo (que não é o de propriamente tornar "melífluo aos ouvidos"). Será que Joyce teve essa preocupação de tornar melífluo aos ouvidos os intricados trechos que escritores como Yeats admitiram saltar em sua leitura?
    Uma questão me angustia então: até que ponto um trecho deve ser potente em sugestões? Até não ultrapassar a fronteira do gosto auditivo (ou outro que o valha)do leitor? Será que Joyce teve essa preocupação?
    Sua visão do "modernismo" é concreta, objetiva. Entretanto será que no lema Poundiano de Make it new não está algo além da preocupação de "apenas escrever"?
    Eu entendi sua posição sobre a "frase que citei fora de contexto", mas a título de esclarecimento: Ao fazer a citação, quis dizer que para você (segundo observei)não houve TOTAL DESVANECIMENTO DA FORMA, uma vez que olhou para um recurso utilizado por mim e identificou imediatamente como um recurso poético que não pode ultrapassar a fronteira da prosa. Simples. Logicamente que escrever torna-se um ato superlativo quando se une expressão e conteúdo, MAS SEGUNDO PUDI ADUZIR DE SEU PENSAMENTO, AMBAS DEVEM SE UNIR DENTRO DE CADA TERRENO. Duas formas não se desvaneceram, a despeito do modernismo: prosa e poesia. E ambas não devem invadir o terreno uma da outra. Fora isso, a forma se desvaneceu. Estaria equivocado nessa interpretação?

    Quanto a lógica... vamos lá. Ao longo de nossas conversas, eu observei inconscientemente que seus pensamentos coincidem em muitos pontos com o falecido jornalista cultural Daniel Piza. A visão sobre o racional e lógico está nessa confluência de pontos. Direi a você o que disse a ele num post em que brevemente nos falamos: a razão e a lógica são importantíssimas e extremamente necessárias, MAS NÃO SÃO O ÚNICO PARÂMETRO PARA SE ALCANÇAR A VERDADE. A devoção dos positivistas à razão explica que o avanço tecnológico que permitiu ao homem voar também propiciou Kamikazes, Condutores de Bombas atômicas, e por aí vai, Contra todo o ideário de "Ordem e Progresso"?...
    Ora, se vejo que há certos campos em que a razão humana não pode alcançar, por que deveria me guiar unicamente nela para levantar hipóteses? Não que seja um louco, só tomo cuidado para não virar uma máquina que processa dados matemáticos unicamente. Como o Homem do Subterrâneo afirmou: "dois e dois são quatro, mas "não hei de resignar-me só porque diante de mim se levante uma muralha de pedra".

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    1. Daniel,

      O problema de modernismo: é mais uma ideologia do que qualquer coisa de uso prático na hora de escrever, alcunha tardia e inútil. Joyce não foi o pioneiro, já existiam muitos antes dele, mas o seu trabalho, que mostrou-se serializado, aglutinou pessoas de mentes afins, que ficavam esperando um novo número do “The Little Review” para ver o que Joyce aprontara, cada guinada era esperada, comentada com avidez por Pound, TS Eliot e muitos outros. Vários ditos “modernos” preocupavam-se com conceitos vindos da Grécia antiga, Ulysses foi a reescrita da Odisséia, poderia ter escolhido a Ilíada, e em vez de nomear Ulysses poderia chamar de Odisseu, muito mais heróico, não o caráter duvidoso condenado ao oitavo inferno por Dante ou personalidade comparada a Fausto. Muitos modernos olhavam e conheciam bem o passado, não é preciso muito para ver o balde de erudição que era TS Eliot, da filosofia para a crítica e poesia, mas nada que não tivesse semelhança com Keats e Shelley, muito semelhantes em si com o berço de Yeats e seus primeiros trabalhos, antes das três mutações subseqüentes. Gêneros que vem de outras paragens parece-me uma tolice absurda, a única paragem é a escrita, se há uma corrente da escrita que se pretende literária, isto só pode ser estupidez, nos dias atuais, apenas indício de morte cerebral. Não está o mundo escrevendo independente da literatura? Por que desconsiderar? Por um acaso a filosofia furtou-se à literatura? Não é literária? Que mar de clichês!

      Há uma confusão na palavra forma, pois pode ter dois significados, forma da “forma antiga”, que usaria formalismo se já não tivesse sido usurpada pelos russos, e forma como uma das engrenagens básicas da máquina narrativa. Quando falo que escrever é unir forma e função, estou falando que é o ato de escolher as engrenagens certas para a máquina funcionar. Quando falo em dissolução da forma falo das “formas antigas”, regras retóricas e outros manuais que ditam como escrever, que no fundo homogeneízam tudo. Há muita mudança! Não achou o Joseph Conrad revolucionário? E a Emily Bronte com “Whuthering heights”, como coloca-la a ombros de pares de seu tempo?

      Tenho minhas diferenças com o Bloom, principalmente por usar uma mística judaica como classificação de autores, mas se lê seu texto, vê que ele leu e entendeu todas as obras, assim como a particularidade de todos os autores, e isso é muito melhor que a historiografia mediocrizante. Ele consegue olhar para o que o autor tem de único, o que lhe faz especial, não do que tem em comum com outros, o que o torna medíocre. O estereótipo modernista imbecilizou a literatura quando preconizou a ignorância do passado, como o WCW atacando a erudição de TS Eliot.

      Não conheço Daniel Piza, mas fico com razão e lógica, a mesma de Sócrates, Kant, Newton, Descartes e Einstein. Kamikazes e condutores de bombas atômicas não são figuras de lógica, macacos fazem guerras, mas não escrevem livros, cachorros se comunicam cheirando o rabo e não produzem cultura que não lhes seja impressa no DNA via seleção natural, se há gente que ainda prefere sair por aí cheirando rabos, não é problema meu, é nossa herança animal, ferida narcísica do inconsciente de Freud e da evolução de Darwin, ao contrário do animal o homem tem escolha, eu prefiro razão e lógica que nos permite escrever livros, ao resto construído cheirando rabos, seja lá o que for, quem sabe bater na muralha da China com a cabeça até que rache? Hipótese aceitável entre caninos e símios?

      Abraço,
      Alex

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  10. Quanto ao vídeo que me indicou, muito obrigado.
    Nele, acho que podemos encontrar uma dado sintomático das discussões que vigoram em nosso país quanto aos rumos da arte. Dentro de seus participantes, temos um que se posiciona pró-formalismo; outro que tem uma visão mais sociológica, no sentido da utilidade da arte para uma ação social relevante, pondo-se contra as "formas engessadas" que transformam o fazer literário mero jogo intelectual; outro que se põe entre esses dois extremos e que proclama a preocupação com o enredo, e outro que busca a transliteratura no campo do formalismo... São posições interessantes, mas nascidas mais da perplexidade de autores que não observam em si o peso titânico de um Tolstoi, Joyce, Tchecov, etc... e nem observam em si os predicados necessários para se elevarem acima do nível medíocre do fazer literário local.
    Aquela discussão é um zeitgeist dos tempos atuais... Não há gênios, e muitos buscam o caminho se deparando com a precariedade de suas estruturas psiquicas e criativas. Daí suas "angústias".
    Onde estará o caminho para a excelência? Na preocupação com as fórmulas? Com o conteúdo? Com a função social? Com a mescla de campos?
    O que você acha, Alex?

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    1. Daniel,

      Acho que a mudança acontece se existir critica verdadeira, este cordialismo mediocrizante é o olhar em direção do abismo, estamos falando de Ulysses, Joyce, Pound, Woolf, veja o nível da crítica da época, veja a nossa. Um pouco de senso do Rubens Figueiredo discordando de uma visão estúpida quase causa um pandemônio, nem abriram o final para perguntas, e este encontro morno foi o mais polêmico de todo evento. Dá para acreditar? Que figuras tão obscuras que temos no meio literário que não suportam a menor crítica? Chega a ser patético! Excelência é uma ameaça! O problema lá não é nem excelência, já melhoraria muito com dois dedos de cérebro.

      Abraço,
      Alex

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    2. Li "Prosa poetica". É importante "O novo". Essa é diferença entre o grande escritor e os demais. Paulo Rónai, critico e amigo de Guimarães Rosa, considerava- o como um escritor cirurgico, o qual pesava cada palavra ajustando-a singularmente como se o lugar ocupado por tal palavra coubesse apenas ela. Além disso, a maneira de trabalhar a prosa poeticamente como em "Desenredo", um de seus melhores contos, a intertextualidade e, enfim, a valorização e inovação linguística como em "pão ou pães, é questão de opiniães", em Grande Sertão: Verdas, sem realmente é um trabalho de Escritor...

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    3. Eliezer,

      Todo grande escritor será “cirúrgico”, verá o mesmo no texto de Shakespeare, Hemingway, Woolf, Balzac, Machado e muitos outros, como na fotografia onde é dificílimo compor de forma diferente uma grande foto, é dificílimo recompor um texto de um grande escritor para que fique melhor. Intertextualidade é algo que pode vazar no texto mesmo de maneira não intencional, não é uma marca de grande escritor. Sem habilidade escrita é possível fazer algo novo, mas para construir algo que existe,que funciona, é preciso intenção, veja o exemplo do Becket, sob a sombra de Joyce era apenas um segundo, cópia, pelo bem ou mal foi ao assumir sua identidade que transformou-se em autor. Não acho que é preciso fazer novo, é preciso fazer seu!

      Abraço,
      Alex

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    4. Alex e Eliezer
      Às vezes tenho a impressão de que os escritores se furtam a uma perscrutação mais profunda para evitar o "esgotamento da obra" que produziram. Por isso evitam a discussão aberta. Logicamente também temos aí uma espécie algo estranha de corporativismo, um escritor não se atreve a esmiuçar a obra do outro porque parece estar tão firme em suas convicções estéticas que apenas vê o outro como um divulgador de suas crias.
      Analisando friamente o encontro que Alex me recomendou via link, sinto como se todos os artistas estivessem perplexos ante a vastidão que se lhes apresenta e é oriunda do que se fez pós-1922. Sobre a busca pela excelência que mencionei, pelo que tenho observado no campo cultural da escrita, há duas espécies de escritores: os que ambicionam o patamar da mais elevada arte praticando uma literatura que não se presta aos olhares despreparados do leitor comum, e aqueles que pegam da pena para tentar, através dela, seguir a trilha de sucesso de, entre outros, Coelho, Rowling, Brown, etc. Para estes, a literatura não é um fim, mas sim um meio. Quem não gostaria de gozar do conforto financeiro de um Coelho?
      Quanto ao que apontou o Eliezer e a réplica de Alex, concordo plenamente com o "fazer seu", porque através dele você pode alcançar o "novo" e contribuir com a Arte. Mas o ponto que merece esclarecimento é o do "cirúrgico". Pelo que percebi de Eliezer, esse ponto diz respeito ao trabalho minucioso com a linguagem, mas Alex coloca o "cirúrgico" de uma forma mais abrangente... Precisamos definir os termos. Dostoiévski era menosprezado por, entre outros, Tchecov, segundo parece pelo desleixo na construção frasal e outros cacoetes. A relação de Dostoiévski com a linguagem é bem conhecida de seu leitor. Muitos afirmam que seus problemas de cunho financeiro influenciaram (mais para o mal que para o bem) sua escrita, que então se ressente de um rigor maior. Mas nenhum de nós seria louco de afirmar que o escritor russo não faz parte do panteão de "grandes escritores". Seria ele um "cirúrgico"?

      Saudações...
      D.

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    5. Daniel,

      Ri muito quando usa a data de 22, uma vez que ela em realidade nada representa que não seja o “lançamento” do estereótipo modernista brasileiro, copiado e canibalizado do estereótipo internacional, a tal antropofagia... nada há aí de verdadeiramente literário, e pauta uma visão estreita, ignorante e acéfala de algo que já acontecia antes da virada do século. Foi o evento de um clubinho, e de clubinhos de medíocres que se constitui até hoje a literatura brasileira, é uma patologia! Quem foi o grande crítico do modernismo? Quem poderia representar uma discórdia saudável? Quem tinha inteligência e uma língua ferina? Quem foi homenageado post-mortem na maior demonstração da hipocrisia da literatura nacional? Quem quando vivo deveria ser calado? E morto vira herói? Oswald de Andrade!

      “Esgotamento da obra”, “corporativismo estranho”, “perplexos ante a vastidão que se lhes apresenta”, “literatura que não se presta aos olhares despreparados do leitor comum”; vamos simplificar? Mediocridade grotesca!

      Faulkner acusa Hemigway de nunca obrigar o leitor a usar um dicionário... Dostoievski, mau escritor? Nunca consegui ler os textos no original, mas já li em traduções para inglês e português, se seus parágrafos não são mestrais, o que seria? Ficam magníficos em duas línguas diferentes, não seriam em russo? Penso que a pendenga de Chekov seja a mesma que entre Faulkner e Hemigway, e isto é sinônimo de boa literatura, boa crítica, não de compadrio vagabundo, apesar das críticas Dostoievski vive, Faulkner vive, assim como Hemingway, quem são nossos autores de vidro que não podem com críticas? Que literatura é esta que não sobrevive autônoma?

      Há uma literatura que vive de clichês literários, da falta de entendimento do “artístico”, da mistificação acéfala da mediocridade, há outra que tenta apenas comunicar-se sem qualquer preocupação com a excelência do ofício, entre elas, nada! Crítica verdadeira, a mera busca pela excelência são pecados!

      Abraço,
      Alex

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    6. Caro Alex
      Há um erro evidente em seu primeiro parágrafo (que talvez tenha surgido de um erro meu, que pequei por não ser específico): O de achar que me refiro à Literatura Brasileira.
      Retomemos: O que acontece no emblemático ano de 1922? Joyce lança seu Ulisses, Eliot o seu The Waste Land, Proust Morre (mas sua obra segue em publicação), Virginia Wolf lança O quarto de Jacob... Entendeu?
      Mesmo que procurasse, não conseguiria encontrar um argumento válido que defendesse os modernistas de nossa terra contra ofensas como "quermesse literária" que revistas como a Veja lhe lançaram...
      Sobre Faulkner e Hemingway, Dostoiévski e Tchekov (e este contra Gorky, vale acrescentar), o foco da discussão gira em torno do termo "cirúrgico" que Eliezer utilizou, segundo penso, no sentido de talhar poeticamente a frase (ou, de forma mais abrangente, talhar a frase, flaubertianamente). Então, para que esse aspecto evolua em nosso diálogo, é preciso perguntar: o que você entende por "Cirúrgico"?
      Inclusive, sobre sua afirmação de que "Dostoiévski vive", assim como Hemingway, Faulkner... É preciso que definamos porque vivem. Você disse a Eliezer que "todo o grande escritor será cirúrgico", mas podemos concordar (penso) que em Tchecov o "cirúrgico" está presente no laconismo e contenção expressiva da frase, o que creio não se pode achar (no mesmo nível) em Dostoiévski...

      No mais é isso...
      D.

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    7. Daniel,

      A grande polêmica de Ulysses aconteceu de 18 a 20 quando fui publicada serializada. Imagine a surpresa dos leitores ao ver cada capítulo em um estilo diferente? Por isso foi o coagulador de muitas idéias, mas veja que “Leaves of Grass” é de 1855! “Night and Day” é de 19. Vinte e dois não é um ponto de mutação, mas passagem na corrente do rio. Muito aconteceu antes, “Heart of Darkness” é de 1899, de onde tirou a idéia que 22 tem qualquer referência especial?

      Cirúrgico acredito ser a arte de usar as palavras com precisão e mestria para o efeito desejado, tanto é verdade para Hemigway como para Milton. Cirurgiões fazem o que se deve com precisão, caso contrário o paciente morre, é usar as ferramentas com propriedade, desde quando um cirurgião talha poeticamente? Ele corta o que precisa, com precisão, eficiência da função. Aprendi ao observar os grandes mestres da fotografia, que é muito difícil, quase impossível, recompor suas fotos para que fiquem melhores, elas simplesmente estão no melhor formato possível. O mesmo vi que ocorre com o texto dos mestres, ele fica tão certo que é quase impossível mudar para melhorá-lo.

      Um cirurgião é preciso no que é necessário, quem opera o cérebro não opera o tendão do pé, a cirurgia de Dostoievsky é diferente de Chekov; mas o paciente vive!

      Abraço,
      Alex

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    8. Caro Alex,
      Para a pergunta que finaliza seu primeiro parágrafo, limito-me a repetir os fatos que elenquei antes. Sei que Ulisses foi serializado, e que problemas com a censura prejudicaram esse processo... Mesmo que não houvesse esses problemas, tomo a liberdade de achar que a publicação integral da obra é mais relevante. É o todo.
      Ainda que isso não convença, apenas o fato de duas obras do quilate de Ulisses (porque de fato foi integralmente publicada em 22) e The waste land terem sido publicadas no mesmo ano já torna o ano da publicação EMBLEMÁTICO, como afirmei, e não um marco zero ou início de um estilo de época. As citadas obras são das mais influentes de tudo o que se fez depois delas, devemos colocar Coração das Trevas e As Folhas da Relva com igual importância para o Modernismo, para a literatura do século passado?
      Aliás, não devia sequer repetir o que vem adiante uma vez que já deixei claro anteriormente em tudo quanto afirmei, mas enfim... Ulisses se destaca pela INTENSIDADE com que experimenta, não encontrável em qualquer época antes dele. Já falei: não encontrei semelhante no que li outrora em Stendhal, Flaubert, Dostoiévski... Joyce teve a coragem (que lhe imputou Borges num poema) de seguir adiante sem o receio de criar um monstro, mergulhou fundo na Expressão... Conrad fez o mesmo?
      Recomendo-lhe o livro O Mundo Moderno: dez grandes escritores, de Malcolm Bradbury; uma visão não-dogmática sobre o que se dá o nome de modernismo.

      Sobre cirúrgico... Entendo o termo aplicável somente ao talhamento da frase (ou verso): Um cirurgião corta a adiposidade de um tecido, ou procede numa incisão a fim de eliminar a parte afetada pela patologia. Em suma, os apontamentos que você fez no texto da Maurem a fim de cortar EXCESSOS, isso eu considero cirúrgico. Se a cirurgia de Dostoiévski é diferente da de Tchecov, apenas leio desse último (e observo até onde é possível, uma vez que leio apenas traduções) sua contenção auto-imposta na frase e a fama que ganhou por isso... Mas, fora Masha e Irina e Olga, não lembro (até onde li) de qualquer outro personagem tchecoviano, mas sobre Dostoiévski... Raskolnikov, Porfiri, Svidrigailov, todos os Karamazóv, O Homem do Subterrâneo... A habilidade de Dostoiévski não é talhar a frase, mas criar personagens inesquecíveis, como não o faz Tchecov. Simples. Nem deveria falar isso para você, uma vez que afirmou numa das nossas conversas anteriores que cada escritor se destaca por uma habilidade cuja magnificência elide seus defeitos... Logo, não são todos que são "cirúrgicos". Pelos menos, no meu critério, Flaubert, Tchecov, Graciliano e Hemingway (e mais alguns...) são "cirúrgicos.

      Abraços,
      D.

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    9. Daniel,

      Sem folhas de grama não teríamos a terra desgastada, sem afundar-se nas trevas da alma humana nosso Ulysses seria outro.

      Acredito que precisa ler “Ulysses” e entender a coisa por si, o mesmo digo do “Heart of Darkness”, foi um dos livros que desafiou a narrativa ao dizer o inenarrável, aquilo para o qual palavras não bastam. Leia ambos e aí entenderá. Depois podemos ter um meio termo comum de conversa, assim fica difícil.

      Todas minhas intervenções no texto da Maurem não são nem de longe cirúrgicas, opiniões grosseiras de um leitor, só o autor pode ser cirúrgico ao construir o texto, eu fui abrutalhado. Seria até uma ofensa tentar ser “cirúrgico”, pois estaria usurpando da escrita em minha mão, não é minha intenção, dei uma opinião de leitor, nada mais; evito ser feitor.

      Veja este parágrafo, sofreu pelo menos duas traduções, pois não foi (com quase toda certeza), traduzido diretamente do Russo. Tal lógica, encadeamento de idéias, teses, antíteses, ironias e desafios permanecem, impecáveis, montados com precisão. Não é um grande cirurgião?

      Continua...

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    10. Continuando:

      "Vê pois Tu mesmo que tinha razão: Tu ou aquele que Te interrogava? Lembra-Te da sua primeira pergunta e sua significação profunda: "Queres caminhar para os homens de mãos vazias, oferecendo-lhes uma liberdade que, na sua simplicidade e na sua corrupção inatas, não poderão sequer compreender, e da qual terão medo, pois nunca houve nada mais intolerável que a liberdade para o homem e para as sociedades humanas. Mas vês essas pedras, no deserto árido e ardente? Transforma-as em pães, e, igual a um rebanho, a humanidade reconhecida e obediente se precipitará aos Teus pés, tremendo ao mesmo tempo no pavor de que retires a Tua mão e não lhes dês mais pão." Mas tu recusaste privar o homem da sua liberdade e repeliste a proposta porque - pensaste, que vale uma liberdade que se compra com pão? Respondeste que nem só de pão vive o homem. Porém não sabes que será precisamente em nome deste pão terrestre que se erguerá contra Ti e Te vencerá o espírito da terra, e que todos o seguirão, clamando: "Quem é semelhante a essa Besta que nos deu o fogo do céu?" Sabes que passarão os séculos, e que a humanidade proclamará pela boca dos seus sábios que não existe crime, nem pecado, portanto, e que há apenas famintos? "Dá-lhes de comer, e depois exige que sejam bons!" Eis o que será escrito no estandarte que hão de erguer contra Ti, e que abate o Teu templo. Um novo edifício se há de erguer no local do Teu templo - uma nova torre de Babel; e embora a nova Babel deva ficar inacabada como a primeira, Tu poderias entretanto ter poupado aos homens essa segunda torre, poderias poupar mil anos de penas aos humanos, porque eles acabarão voltando para junto de nós, depois de mil anos de sofrimento em redor da sua torre. Irão nos procurar debaixo da terra, nas catacumbas (porque de novo seremos perseguidos e martirizados) e quando nos encontrarem, hão de implorar: "dai-nos de comer, porque aqueles que nos prometeram o fogo do céu não no-lo deram!" E então nós completaremos a torre, porque aquele que os alimentar é que há de acabar, e só nós os alimentaremos, dizendo que o fazemos em Teu nome - o que será uma mentira. Oh, nunca, nunca conseguirão eles alimento sem o nosso auxílio. Nenhuma ciência lhes dará o pão enquanto se conservarem livres; porém no fim, eles próprios virão depor sua liberdade aos nossos pés, dizendo: "melhor será que nos torneis escravos, contanto que nos deis de comer". Compreenderão afinal que a liberdade é inconciliável com o pão da terra, porque jamais saberão partilhar entre si. Acabarão também convencidos de que jamais serão capazes de ser livres, porque são fracos, miseráveis e rebeldes. Tu lhes prometeste o pão do céu: mas - repito-o - poderá o pão do céu ser comparado ao pão terrestre, aos olhos da raça humana, imponente, sempre ingrata e corrompida? E se milhares de milhões de seres incapazes de preferir o pão celeste ao pão da terra? Só Te serão caros as dezenas de milhares de grandes e fortes, e os outros tão numerosos quanto areias do mar, os fracos que apesar de tudo Te amam, não servirão senão de instrumento aos grandes e aos fortes? Não, os fracos também nos são caros. São entes rebeldes e corrompidos, porém acabarão obedecendo. Hão de nos admitir e considerar como deuses, porque consentimos em assumir essa liberdade. Mas nós - nós diremos que Te obedecemos, e que reinamos em Teu nome. Mais uma vez os enganaremos, porque não já consentiremos, então, que Te aproximes deles... E nessa impostura é que consistirá o nosso sofrimento, porque seremos obrigados a mentir.

      Sim, todo escritor destaca-se no seu melhor, mas todo grande escritor tem domínio da própria arte! Veja que este trapo, mesmo rasgado e desfigurado, conserva sua mestria, e segundo o critério mínimo de Schopenhauer, ainda é sublime.

      Abraço,
      Alex

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  11. Olá, caro Alex... Desculpe pela manifestação um tanto tardia.
    Uma pergunta se faz necessária antes de se discutir o Modernismo: Qual sua origem? Deveríamos apontar as vanguardas, que em si são uma reação ora estusiasta, ora pessimista ante os avanços tecnológicos (quando o ritmo frenético da vida de então, além da invenção do automóvel e outros inventos que mexeram com a noção de tempo e espaço então estabelecida) como o elemento catalisador de uma nova prosa e poética, ou as diabruras de Joyce que, POR CONTA DA INTENSIDADE E CORAGEM, ALÉM DO EXERCÍCIO SISTEMÁTICO DE MEIOS QUE JÁ EXISTIAM (COMO O FLUXO DA CONSCIÊNCIA), foram definitivas para o que se fez de literatura no futuro?
    Lógico, ninguém naqueles tempos estava muito interessado nessa nomenclatura (se não me engano no Brasil o "modernismo" foi nomeado primeiramente como Futurismo), no entanto é evidente que o que se fez após esse estranho advento não tem paralelo com o que o precedeu outrora. A forma passou a ser considerada como elemento volátil e tão significativo na prosa como na poesia de outrora. Passamos a encontrar nas estórias trechos de jornais, gêneros textuais os mais diversos, como o de catequese, mimetizações extremas da estrutura mental humana (pensamentos sem pontos ou vírgulas), etc. Sim, não acho desprezível falar de gêneros de outras paragens, pois (salvo engano meu) Stendhal, Balzac, Tolstoi, Dostoievski e mesmo Machado não levaram a forma até as últimas consequências (incorrendo em “aberrações estéticas” do que se tem por “moderno”).
    Deveria desconsiderar um fenômeno que consiste em uma estória narrada, sei lá, na forma de uma receita (estou forçando um pouco a barra, ok...)? Seria irrisório alguém que contaminasse esse gênero aliterário com a força de uma arte expressiva? Seria “tolice absurda” (se é que entendi direito seu argumento), em prol da consciência de que falar em “narrador de terceira pessoa observador ou não” é um absurdo após o emblemático ano de 1922?
    Sim, parece que há “gêneros literários e não literários”. Lembra do que afirmara Aristóteles sobre uma página de estória escrita em versos que nem por isso deixaria de ser história?

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  12. (Continuação)
    Logicamente que aquilo (não nomeemos) que aconteceu não mais observa Aristóteles, muito pelo contrário: transforma aquilo que é de natureza diversa em objeto de arte e reflexão. Simples assim. Reflitamos: o que Joyce fez que mobilizou diversas mentes em confluência com uma ideia em especial?

    Sobre o tema de forma/conteúdo. Alex, eu sempre concebo forma como a materialização do fazer artístico. Como escrevi em outro post neste blog, entendo forma/conteúdo da mesma forma como Saussure entende a língua, isto é: significante/significado. Aquilo que você diz haver desvanecido, chamo simplesmente de CONVENÇÕES LITERÁRIAS. A fim de evitarmos futuros equívocos, proponho a dicotomia expressão/conteúdo. Não concebo necessariamente que "a máquina funcione" pela união de ambos, uma estória pode se sustentar apenas com seu CONTEÚDO independente se é narrada em primeira ou terceira pessoa. O que acho é que a união entre expressão e conteúdo proporciona um patamar maior, consistindo esse no fenômeno de dar um sentido profundo para uma abstração (a forma, a expressão).

    Também tenho minhas ressalvas com o trabalho de Bloom (que é deplorado pelos acadêmicos...). O meu problema com ele é tentar converter todos ao agnosticismo (segundo Daniel Piza, ele concebe a Literatura como gnose), é "não gostar de T.S. Eliot" por ser um "corroinha de Cristo" (algo assim). Então John Milton nem mesmo é cristão e, pior, é passível de ser concebido como um agnóstico. Fora isso, claro, temos aquela Shakespeadolatria... Seria capaz de converter Dante a esse credo, se esse não tivesse vivido muito antes do Bardo.
    Fora isso, Bloom é estimulante, principalmente para um neófito. Seu texto nos faz entrar em contato com o que é permanente e não escolástico nos grandes mestres. Acho que não há propriamente uma ignorância do passado nos modernistas, até porque o que Joyce com a mitologia, outros também fizeram (a seu modo) como Camus, Kafka, etc.

    Sobre Razão (assim mesmo, com maiúscula) e lógica... Você deu o contorno definitivo à questão quando regeu seu argumento com o verbo "fico". É simples questão de preferência.

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  13. (continuação)
    A minha postura nesse caso é do cientista que ao ver que um determinado método não dá conta de seu objeto de estudo, procede numa mudança saudável. O que a razão diz sobre a perversidade humana? Qual sua origem? Por que o avanço científico, intelectual e racional não proporcionou a felicidade plena, antigo credo positivista? A Razão é essencial, mas durante a história passou por sacralizações e absolutizações que não proporcionaram a simples constatação de que A RAZÃO É LIMITA, COMO TODO E QUALQUER RECURSO, E POR TAL NÃO É O ÚNICO PARÂMETRO PARA SE ALCANÇAR A VERDADE.
    Se você leu o tratado dantesco Da Monarquia, verá um livro redondo e grande em sua concepção e no uso da razão mais rigorosamente aristotélica em função de uma falácia, a saber: o estribilho que se repete em todo o livro, PARA O BEM DA HUMANIDADE, A MONARQUIA É NECESSÁRIA. Os argumentos de Dante são cristalinos, seus raciocínios são redondos, mas concluem algo tão ingênuo que é de se espantar que o grande poeta tenha incorrido em tal engodo.

    Em suma: Use a razão (com letra minúscula), e quando essa não der frutos, procure outro caminho.

    Abraço,
    D.

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  14. Adendo ao comentário anterior:
    Percebo que a direção dos meus argumentos podem criar a falsa imagem de um sofista versânico, antiracionalista. Não é o caso. No que diferimos dos animais que "cheiram o rabo do outro"? Na razão, sem dúvida, mas também no sentimento, na sensibilidade, no instinto, inclusive o artístico (acho que concorda comigo que a Arte transcende o puramente racional). Não mistifico a Arte, mas percebo que esta me transporta à uma dimensão crítica e sensível que não está ao alcance do leitor de jornal, por exemplo. O que seria a Arte? Um lance de dados que elide o acaso, um simples jogo intricado mas essencialmente racional de elementos estilísticos para um objetivo puramente premeditado racionalmente?
    Desculpe os desvios de português nos comentários, simples fruto da afobação na hora de digitar... "até porque o que Joyce [fez] com a mitologia", sem falar no "A RAZÃO É LIMITA(DA)".

    É isso...
    D.

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    1. Daniel,

      Vamos voltar um pouco, ficou claro que “prosa poética” é um rótulo que não serve nem para escritores nem para leitores, uma vez que formas morreram na virada do século? Não é melhor deixar isso no lixo das ideologias inúteis e das mistificações vigaristas?

      Gênero literário é só um clichê recente, há literatura, nada mais, clichê por definição nunca é moderno, mesmo sendo clichê modernista, ainda é clichê, uma forma feita, pré- pronta, pré-aprovada: acéfala. É só imiscuindo-se no laboro do ofício que se chega à excelência, não tem atalho, é uma viagem pessoal, sem guia, sem mapa, e principlamente, evitando as armadilhas mistificadoras do artístico moderno. Uma estória pode sustentar-se apenas com conteúdo, mas este não é o ofício último do escriba, que deve prezar da habilidade e mestria sobre a pena, unindo forma e função.

      O fato do Bloom ser deplorado pela academia faz-me mais afeito a seu trabalho, nem sabia, mas a realidade é que seu texto fala de obras verdadeiras e que o misticismo está apenas em classificações cabalísticas. Sua visão pela obra é excelente contra a babaquice mistificadora historicista, há mais razão em Bloom do que nos estereótipos historicistas. Academicismo oco, infértil e acéfalo.

      Sem razão não há conversa, não há argumento, não há critica que seja pertinente, há lógica e há mais lógica; Newton tinha lógica, ainda tem, Einstein tem mais lógica. Quem hoje entende a teoria da relatividade restrita? E a Geral? Razão e lógica são supremos se quisermos discutir algo, não existe discussão sem lógica, não existe escrita sem lógica. Falácia é justamente o truque de falsificar lógica, onde não há. Postura de cientista é lógica, como fugir dos demônios falsificadores cartesianos? Não me fale de ciência sem lógica, não existe. O ser humano não é racional por natureza, derivou dos animais irracionais, razão e lógica são escolha, não é a natureza do ser humano, já lhe expliquei das feridas narcísicas de Darwin e Freud.

      Como disse há lógica e há mais lógica, veja os textos de Freud, excelente escritor, tão bom que frauda a lógica factual em muitos aspectos, por ele o ser humano é mau! Em sua essência, não há comedimento, só o superego social, e ele não leva em conta a própria natureza do nosso sistema nervoso e sua origem evolutiva, tira a conclusão do nada, mas sem lógica, ou com menos te convence que nosso id é mau.

      Há lógica, ou mais lógica, nunca justificativa para a falta dela.

      Abraço,
      Alex

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    2. Caro Alex,
      Sim, ficou claro que sua ótica é de conceber que "prosa poética" não existe. O problema que enxergo em sua abordagem é que ela não isola o texto em si, esquecendo do autor que se autoproclama poeta/prosador, e enxergar os dados que são dados por esse texto. O texto apenas, abstraindo-o de tudo o mais.
      Para ilustrar melhor minha ideia: Se coloque no lugar de um Teórico Literário ou, melhor ainda, de um PROFISSIONAL da Estilística, para quem as questões de superioridade de um texto (ou seja, valia estética) nada dizem, diante dos fenômenos que emergem do texto... Não sei se respeita tais profissionais e pesquisadores, mas enfim, seguirei no argumento... Pois bem, esquecendo a relevância qualitativa do texto e cientificamente observando as ocorrências do texto (podendo ser o que eu postei), me responda: há ou não ocorrências de ambas as naturezas, da prosa e da poesia, nele? Essa é a minha postura, simples assim. Há um texto que utiliza de recursos de naturezas diferentes, pois como sabe nos manuais normativos do "bem escrever" deplora-se rimas num texto em prosa, tais são tachadas como "ecos". Ainda sim, o autor as utiliza... E aí vem a conclusão de nossas divagações:

      Alex, você deseja observar esse assunto do qual estamos tratando com um viés qualitativo (digamos melhor: estético) ou objetivo (no sentido de que, não importando a qualidade, há um texto que surge por hibridismo?). Se sua posição é a primeira, estou propenso a concordar com você, mas acho que o caminho mais interessante seria um misto dos dois: primeiro analisar friamente textos de fontes mais diversas possíveis (e que especialistas e leitores tem por prosa poética) e então aplicar o primeiro critério...
      A falar a verdade, creio que você já seguiu por esse caminho antes de escrever seu artigo que gerou nosso diálogo. Devo-lhe confessar, a título de explicação (pois desconfio que me esteja julgado um obstinado sem razão) que aplico mais o segundo método que o primeiro. Você já leu os poemas de Bertold Brecht? Neles eu vejo um predomínio da linguagem denotativa em detrimento da conotativa, o que faz seus poema parecerem prosa versificadas... Nem por isso chamo seus poemas de "poética prosística", não vou criar "um rótulo que não serve nem para escritores nem para leitores", mas não posso ignorar o fenômeno, pois será de grande valia para a leitura de Brecht... Detenha-se nesse exemplo e então entenderá minha posição.

      Sobre os gêneros... Desculpe, não especifiquei que quando falo de "gêneros" não estou mais no campo literário. Aliás, ficar só nesse me parece limitante... Acho mais ilustrativo, para nossas questões, o viés de Bakhtin dos Tipos e Gêneros Textuais

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    3. Daniel,

      Você teima em usar clichês, diz que o texto deve ser visto pelo que há nele, mas insiste em enquadrar-lhe em clichê: “prosa poética”! Um clichê que vem dos manuais normativos do "bem escrever". Esqueça as formas pré-prontas, pense a literatura em seus ingredientes básicos, as engrenagens que precisam encaixar para formar uma máquina narrativa própria.

      Imagino que conheça um pouco de semiologia, eles criam regras e definições e intensos debates dentro destes clichês, e assim geram algo que não faz sentido para o mundo, mas apenas aos clichês semiológicos em si mesmos, e desta maneira falham em ver a realidade de maneira fragorosa. É como a estupidez dos estudos marxistas, é um círculo que volta sobre si e nunca vê o mundo. Agora você tem a resposta se respeito teóricos literários e “estetistas”. É um debate que perde a ancora da realidade, e assim, toda e qualquer validade inexiste.

      O problema está em você achar que está vendo o fenômeno, mas o encobre com um clichê superficial e inútil. Há um “meme” literário que diz que existem apenas duas estórias: “A jornada do herói” e “o estrangeiro chega na cidade”, e todas as estórias do mundo podem cair em uma destas qualificações, e se olhar é verdade, mas isso não diz nada sobre a literatura em si, é um cobertor que impede de ver o fenômeno real, uma simplificação grosseira que despreza o mais importante, da mesma maneira posso dizer que a maioria dos livros tem letras em contraste diferente ao da página, ou não, estou falando de todos os livros e nada de útil. Como a estupidez de colocar Joyce em Twite, jogou-se a obra, o fenômeno verdadeiro no lixo.

      O “Novo Organon” de Bacon resolveu olhar para a natureza em vez de classificar as coisas segundo as ordens angélicas, ele optou por ver a realidade e tirar dela as conclusões. Mas veja como em literatura as pessoas teimam em re-criar o Organon Aristotélico, construindo ordens angélicas e ordenando o mundo segundo seus mitos sem olhar para a natureza, para a realidade.

      Abraço,
      Alex

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    4. (continuação)
      Esse viés (inclusive seus desenvolvimentos por outros autores, que tem sido o foco principal dos parâmetros curriculares nacionais) permite, por exemplo, enxergar no gênero Carta, onde predomina o tipo textual Relato, trechos de outros tipos, tais como da ordem do Argumentar, do Descrever, do Narrar, etc., de acordo com a necessidade do autor do texto (mas o que predomina é o Relatar). Daí você pode compreender melhor meu método ao abordar a "prosa poética".
      É por isso que enxergo apenas nos escritores que despontaram no início do século passado a perícia de pegar gêneros de outras paragens e transformá-los em matéria de arte.
      Sobre sua assertiva de alcançar a excelência através de uma viagem pessoal, eu concordo plenamente. Inclusive em O Tempo Redescoberto há uma frase semelhante, que conclui que o ato de escrever advém de uma viagem empreendida pelo artista e que não admite suplentes...
      Também concordo sobre Bloom, mas convenhamos que às vezes ele viaja um pouco "na maionese", mas enfim... É um apaixonado, que por isso se destaca. Não sabia que ele era deplorado pelos acadêmicos? É. E sabe por que? Pasmem, justamente pela falta de rigor científico (ou seja, lógico e racional) em suas assertivas... E isso nos leva ao próximo tópico.

      Espero que tenha ficado claro que não sou contra a razão e a lógica, apenas contra sua absolutização que em nada contribui, e que foi levada à cabo pelos positivistas (aliás você disse para não lhe falar de ciência sem lógica...). O credo positivista lhe parece lógico? Talvez por ser lógico em demasia concluiu algo que infalivelmente (por meio da lógica) deveria acontecer, quase como a conclusão de um silogismo: dominando os conhecimentos científicos que permitem a total compreensão de tudo quanto existe, além dos mistérios da natureza, o homem chegaria finalmente ao estado positivista, elidindo o teológico e o metafísico, e alcançaria à plenitude... Foi o que aconteceu?
      Sim, Alex, existe ciência sem razão, ciência ideológica e idealizada, incapaz de enxergar seus limites.
      Se tiver um tempo, uma vez que disse não conhecer o falecido Daniel Piza, visite este link: http://blogs.estadao.com.br/daniel-piza/a-liberdade-da-descrenca/#comments
      Recomendo-o não só pela pertinência do nosso diálogo, mas por achar que há muita afinidade entre seu viés e o dele. Atente ao comentário de um certo Pietro (esquecendo seus desvios de português, por favor...) e veja a última fala de Piza. Atente bem ao que ele afirma...
      Tenho um fraco (mais bem fraco...) conhecimento das feridas narcísicas empreendidas por Copernico, Darwin e pelo próprio Freud. O que você acha das ideias de Freud? Elas, que há um tempo foram tão influentes, estão agora desacreditadas justamente por não passarem pelo crivo da razão científica... Mas ele ainda é relevante. Ele não é estritamente lógico (senão, penso, não teria sido desacreditado, até mesmo pelo Bloom) mas ainda sim é relevante... Como resolvemos isso?

      No mais, saudações...
      D.

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    5. Alex,
      Você respondeu rápido, nem deu tempo de anexar a segunda parte do meu comentário... Depois de você ler a segunda parte eu comentarei o que escreveu, para enfim chegarmos num consenso.
      Apenas, à título de explicação, me elucide sobre os clichês que adoto... Prosa poética certamente não é um deles. No post que publiquei não afirmo "existe prosa poética", mas sim que há textos que mobilizam recursos que são PREPONDERANTES de um ou outro campo, e daí surge algo novo, para o bem ou para o mal de nosso gosto estético.

      No aguardo...
      D.

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    6. Daniel,

      Tenho o péssimo hábito de rolar no chão de tanto rir sempre que alguém das ciências humanas fala em científico, não que nas exatas inexistam cientistas espúrios, mais do que deveriam, mas tanto um como outro, usam cientificismo apócrifo, a não ciência. O Bloom é acadêmico, se é deplorado pelos pares, isto é magnífico, pois tem peito de fugir do corporativismo mediocrizante, também não o acho científico, e duvido que pretenda, mas quando ele fala do livro eu vejo o livro, não um estereótipo banalizante como outros acadêmicos. Veja o Terry Eagleton e seus estudos literários marxistas, é o tal clichê que lhe falei, científico? Bacon e Descartes ririam, Popper choraria. E não é por gostar de alguns aspectos da crítica do Bloom que eu assino tudo que escreve, como não assino Freud, fez coisas importantes, a descoberta do subconsciente, mas errou e mistificou muito, e por ser um magnífico escritor convenceu muitos a cair no mesmo erro. Eu sempre digo que uma pena nas mãos de Nietzsche ou Freud é uma arma apontada contra a humanidade.

      O clichê que digo é sua própria insistência nestas coisas tipo Bakhtin, antes de classificar veja o fenômeno, tente ver, observar sem viés, sem hipótese prévia, lembre-se que a sistemática nasceu com o Organon, é um clichê, qual seu uso no mundo real? Qual o uso das teorias auto-referentes da semiologia? Não são elas formas pré-prontas?

      O credo positivista é como disse um “credo”, fruto da credulidade e não do raciocínio analítico, infere sobre o que não sabe, o que não tem nem condições de saber, e assim como todo credo, prescinde de provas; não pode ser testado, não pode ser científico, não pode ser falsificado, não pode ser científico. Se um dia poderemos nos tornar demônios de Laplace, só o tempo dirá, mas digo pela teoria da informação quântica, que isto só pode acontecer para um único ser, pelo local(físico) que ocupa a sapiência de tal demônio. Eu ainda sou Socrático, em todo meu caminho torno-me mais consciente da minha incomensurável ignorância, mas não desisto, vou em frente, e por óbvio que seja, sei hoje mais que Sócrates e consequentemente mais consciente da imensidão de tudo que não sei. Não existe ciência sem razão, nem ideológica, nem idealizada, tudo isto é quando a ignorância inconsciente usurpa o nome da ciência.

      Dei-me ao trabalho de ler o texto do Piza, assim como o Pietro, sinto-me quase ofendido com a comparação, mas a hipótese do Pietro assemelha-se muito à hipótese “many worlds” da quântica, e enquanto hipóteses, são as menos prováveis, aquelas que não temos o menor sinal de existência, nem podem ser provadas ou desaprovadas, ignorância falar que existe, ignorância falar que não existe. Fico com a lógica, derivada da causalidade, e se estes fenômenos não tem existência na nossa causalidade, não pertencem à nossa realidade, podem ser frutos do demônio falsificador. Descartes neles!

      Cito nossas feridas narcísicas pois elas nos negaram nossa realeza, e, ainda assim, somos humanos, diferentes dos animais, com um lado consciente e vivendo mesmo que fora do centro da criação. Homens e animais são diferentes, homens podem usar a lógica, como disse antes, ver o interior das estrelas sem nunca lá podendo estar. Não é magnífico poder usar lógica em vez de cheirar rabos? É uma escolha, não dádiva.

      Abraço,
      Alex

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    7. Olá, caro Alex.

      Aqui concentrarei a réplica aos comentários paralelos dos dois tópicos distintos que foram criados. Também serei sucinto, a fim de que equívocos sejam evitados. Creio que assim chegaremos a um ponto em comum.
      Primeiramente, colocarei minhas posições. Depois, explanarei sobre...

      Acredito no RÓTULO Prosa Poética?
      R: Não, sobretudo se for um escudo para se justificar a imperícia. ACREDITO NA PROSA QUE CONSCIENTEMENTE OPTA POR UTILIZAR OS RECURSOS QUE SÃO RECORRENTES NA POESIA A FIM DE OBTER UM DETERMINADO EFEITO PRÉ-ESTABELECIDO.

      Sou contra a razão e a lógica?
      R: Obviamente que não, mas sendo eu um homem, e não uma equação, DOU-ME AO DIREITO DE NÃO SER UNICAMENTE GUIADO POR ELAS, mesmo no campo do levantamento de hipóteses (a discussão sobre razão ocorreu entre nós depois do apontamento irônico sobre as "estrelas"); não quer dizer que seja um ensandecido, MAS VEJO CLARAMENTE OS LIMITES DA RAZÃO.

      Acredito no Modernismo?
      R: Acho cômoda a utilização do termo, na falta de outro melhor. Para se discutir é necessário um mínimo de PEÇAS ESTÁVEIS, ou a discussão se dá num terreno volátil e movediço. Acredito que os ditos modernos tem algo em comum: A CONSCIÊNCIA DO MUNDO VOLÁTIL, INSTÁVEL E DINÂMICO DO SÉCULO XX (PROPICIADA PELAS NOVAS TECNOLOGIAS, PELA FILOSOFIA DE BERGSON, PELOS PENSAMENTOS DE FREUD, ETC.). Nos modernos não há a nostalgia pela Ordem e Equilíbrio, tão incessantemente procurada pelos renascentistas, MAS A CONSCIÊNCIA DO CAOS MODERNO (BLOOM MESMO CHAMA JOYCE, PROUST E KAFKA DE "MESTRES DO CAOS"), DO ABSURDO QUE GRASSA. Não nasceram sozinhos nem o experimentalismo de Joyce nem o absurdo comezinho de Kafka, MAS DIFEREM DOS PRECEDENTES POR UMA QUESTÃO DE "INTENSIDADE".

      (continua...)

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    8. 1) Sobre "prosa poética" (e aqui me permita respeitosamente abordar a sua visão sobre a questão, segundo minha ótica)... Concluí, após ler tudo quanto escreveu sobre o tema, que sua posição é a de deixar bem demarcadas as fronteiras entre prosa e poesia, A FIM DE QUE O QUE FUNCIONA (OU É DE DOMÍNIO) EM UMA NÃO ATRAVESSE O TERRENO E INVADA O DA OUTRA. A você é sofrível tanto o termo "prosa poética" quanto um autor que utiliza métrica — que é um recurso NASCIDO no terreno da poesia, que nela faz sentido e funciona — na prosa (que foi o meu caso que você deplorou). Assim também com as rimas internas de um texto em prosa (o caso do conto de Wítalo, QUE VOCÊ ACHOU POÉTICO: "Acho o texto que postou poético, mas escasso em qualquer verdade útil"). Os dois exemplos patenteiam que você localizou recursos poéticos em textos que são prosa, são contos, ou seja: HÁ TEXTOS QUE UTILIZAM DE RECURSOS POÉTICOS, mas seu escopo é de legitimar o texto que SE SUSTENTA PELA SUA EXCELÊNCIA, ou entrando em seu campo de termos, QUE UTILIZA AS FERRAMENTAS ADEQUADAS PARA O MAQUINÁRIO FUNCIONAR: O CRITÉRIO ESTÉTICO SOBRESSAI SOBRE O OBJETIVO. Para você, usar recursos poéticos em prosa é usar chave Phillips em parafuso Torx. Em outras palavras: não é legítimo.
      Também sou contra rotulações, mas não vou afirmar que uma chave Phillips não funciona na Torx. O GÊNIO LITERÁRIO PODE TUDO.
      Ainda sim, a despeito de lhe ter apresentado os DADOS RACIONAIS que legitimam a métrica em um trecho do meu conto (aliás, reparou como não me dei ares de "prosista/poético"?), SEU SENSO ESTÉTICO AINDA SIM NÃO ACEITOU O RECURSO, NÃO CEDEU A RAZÃO... E vamos assim para o próximo tópico:
      (Mas antes disso, você concorda com tudo quanto afirmei acima?)
      2)Não sou biólogo (nem adepto do evolucionismo), mas não hesito em afirmar que o homem é um ser racional, porque biologicamente dotado dos recurso para tanto. Não é questão de escolha. Em nossas mentes, independente de maiores sandices, ocorrem os trabalhos neurais. MAS O HOMEM NÃO É UNICAMENTE RACIONAL.
      Bloom faz suas afirmações e divagações, mas muitas delas não são dados racionais. Ainda sim, não o taxamos de lunático. Nosso senso estético do belo, ou senso comum do que é belo nesse mundo, não é racional. É subjetivo. Depende de minha apreensão do mundo. Coloquemos um problema para ilustrar: discutamos sobre o que é o Gênio, sua natureza. Nossas razões se entreterão com diversos apontamentos: a qualidade na construção das frases, a construção dos personagens, a percepção de mundo... Iremos divagar incessantemente, mas nossa razão e lógica não definirá satisfatoriamente o que é o gênio, como se originou... Li recentemente um texto sobre Balzac, de Paulo Rónai, e me deparei com a perplexidade do homem (e de muitos além dele) ante o escritor que tinha uma sociedade inteira na mente sem ter sequer tempo de tomar banho diariamente, pois estava em suas "orgias de trabalho"... Lógico que você dirá: "A razão de Balzac o fez ver 'o interior das estrelas' sem nelas ter entrado"... Isso não elucida em nada a questão: O que é o gênio.
      Se leu o artigo de Daniel Piza (e nem sei se viu confluências suas com ele — um iluminista, eu diria), verá que ele mesmo honestamente afirma que "não sabemos de 97% do que é composto o universo", além do dado TOTALMENTE ILÓGICO E IRRACIONAL de haver cientistas QUE ACREDITAM EM DEUS.
      Vamos discutir, Alex, a existência de Deus? Nossa razão e lógica refutarão Sua Existência ou A comprovarão? E não me venha dizer que não é um problema da razão isso... Sendo a razão tão importante, deve poder abarcar tudo quanto há nessa existência. Caso não o faça... A razão tem limitações, e tendo-as o mínimo que deveríamos fazer e considerar suas contrapartes (Concorda?).
      3)Como disse, os "modernos" não são filhos de chocadeira... Ninguém fomenta uma literatura inteira de si. Shakespeare tinha à sua frente Marlowe, Proust tinha Balzac, etc... Volto a repetir (nem sei quantas vezes já o fiz...), É UMA QUESTÃO DE INTENSIDADE.

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    9. Não preciso ler Ulisses de cabo a rabo para mensurá-lo. Não sou pedante. Sou um leitor, mas também um praticante de literatura. Conquanto não tenha um olhar maior nem menor que um leitor comum, TENHO UM OLHAR PREOCUPADO EM ENXERGAR OS PARAFUSOS E AS RODAS DENTADAS POR TRÁS DO MAQUINÁRIO. Escrevi um poema todo no estilo catequético impagável do penúltimo capítulo do livro. Li o monólogo tortuoso de Dedalus em seu terceiro. Dei uma olhada na mente de Molly e no "teatral" do bordel... Nenhum escritor antes de Joyce tinha assim me apresentado uma forma tão significativa quanto seu conteúdo. A MENTE DE MOLLY ESTÁ EM NOSSAS MÃOS, A DE DEDALUS, COM INTERRUPÇÕES ABRUPTAS, MUDANÇAS DE TÓPICO, O ESTILO CATEQUÉTICO "PATINHO FEIO" DE TODO O LIVRO...
      Não poderia mensurar o alcance de Conrad, Henry James... Mas Joyce: Faulkner, Pound, John dos Passos... E em outros países? Rosa, Clarice, muitos dos contemporâneos em debates da Folha, e tantos outros que não me veem à mente agora...
      Ulisses pode ter se originado em O coração das trevas, em Ibsen, nos praticantes do fluxo da consciência... Mas foi Ulisses QUE MOBILIZOU TANTOS ARTISTAS, tal como Proust e Kafka ("o trio imbatível do século passado", segundo Bloom). O que interessa aqui é o adjetivo INFLUENTE, porque tudo isso de Modernismo se originou de um comentário meu acerca dos escritores tupiniquins desnorteados... A data 1922 incomoda? Tudo bem, mudemos a data. Mas o caso é que foram estes, e não outros, os artistas MAIS INFLUENTES DE TUDO QUANTO SE FAZ AINDA EM LITERATURA. (Qual a sua visão sobre essa questão?).
      (Continua...)

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    10. Por fim, o termo "cirúrgico":
      Caro Alex, não fomos nós que inventamos a metáfora, mas temos a total liberdade de nela divagar. Façamo-lo:
      Não é o cirurgião (ou anestesista, ou coisa que o valha...) que nutre o corpo que está diante de suas mãos peritas de vida. Médico não dá vida, o corpo é dotado dela. Cabe àquele apenas nutrir este dos recursos necessários para que sua sobrevida possa ser estendida, MAS EM ÚLTIMA INSTÂNCIA É O PRÓPRIO CORPO QUE SE NUTRE A SI MESMO DE VIDA. Assim, é o próprio corpo das obras de Dostoiévski, Tchecov, Dante, etc., que sobreviveu, graças a sua relevância ANTE SUA PRÓPRIA ÉPOCA E AS ÉPOCAS VINDOURAS. Conquanto a obra nasceu das mãos do artista seu autor, UMA VEZ LANÇADA, ESTA SE DESPRENDE DELE E TOMA EXISTÊNCIA AUTÔNOMA. ISSO QUER DIZER QUE NÃO PODE DEPENDER DO AUTOR PARA VIVER, NEM ATRAVÉS DE SUAS JUSTIFICATIVAS, NEM ATRAVÉS DE SUA PRÓPRIA VIDA, UMA VEZ QUE O SUJEITO IRÁ MORRER E A OBRA É QUE IRÁ FICAR (OU NÃO).
      Concebo suas intervenções sobre cortes NAS FRASES do conto de Maurem como incisivas: cortar, criar elipses, etc., é também tarefa do "cirurgião" (Eliot não chamou Pound de Il Miglior fabblo?). Lógico que o produto final depende dela, mas SEU MÉTODO FOI CIRÚRGICO (e não me venha com modéstias... se considerasse grosseiras suas intervenções, não as teria feito). Cortar palavras numa frase se assemelha ao cirurgião que retira adiposidades. Trocar palavras por outras se assemelha ao cirurgião que procede com uma ponte de safena para o bom funcionamento do órgão. Eliminar termos impróprios é como extirpar uma célula cancerígena... E só. Não são todos que fazem (bem) isso. Dostoiévski (para meu gosto de leitor, nada pretensioso) é um deles.
      No livro o qual você retirou o trecho que postou, eu diminuiria bem (a despeito de minha simpatia por sua figura) a hagiografia do religioso Zósima, faria de Aliosha mais que um garoto de recados (mesmo sabendo que o autor pretendia um segundo volume com este personagem) e diminuiria drasticamente a extensão do embate no tribunal... Em Crime e Castigo então no que diz respeito à extensa fala (e consciência lúcida!) de Marmieládov com Raskolnikov e o episódio de Lujin tentando incriminar Sônia (que pouco acrescenta à narrativa...) nem se fala!...
      Mas, sei lá, ainda bem para muitos que não sou o autor.

      Estou disposto a mudar de opinião, mas nesse terreno a razão, da qual faço uso para produzir minha opinião, ainda dá conta. Cirúrgicos, eu aponto Graciliano, Tchecov, Hemingway, Flaubert...
      Sou assim: adoto todo e qualquer método, mesmo o que pareça ser frouxo por si, SE ESTE DÁ CONTA DO SEU OBJETO DE ANÁLISE. Não sou um ideólogo como tantos que proliferam pelas academias. Não vou proclamar a soberania de Peirce sobre Greimas, tanto se me dá os dois. O que interessa é se o método dá conta de seu objeto. Nesse ponto sou bastante racional e frio. E que fique claro que vou do objeto ao método, e não o contrário. Se adotei Bakhtin é porque este alarga a questão dos gêneros que vem desde Aristóteles, transcendendo o campo literário. Isso me ajuda a ver como um texto que foi criado para necessidades práticas do dia ganha, pelas mãos do artista, uma dimensão artística. Meu ponto de vista ganha com isso...

      Pouco se me dá se os meios oficiais consideram Bakhtin ultrapassado. Nem se não o consideram. Não olho credenciais, apenas funcionalidade.

      Creio que me alonguei além do que era recomendável, mas não necessário...
      Mas isso encerra minha explanação.
      Abraços,
      D.

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    11. Daniel,

      Escrevo um monte e você não se dá o trabalho de ler, vou falar mais uma vez: as formas morreram! As antigas formas morreram, as engrenagens da escrita estão soltas, desvinculadas de seus estereótipos, pode-se escolher qualquer montagem desde que funcione, “Finegans Wake” aboliu a herança, experimentou, não funcionou; Gertrude Stein aboliu o tempo, também não funcionou, passou a fronteira em que a escrita perde seu poder de comunicação. Disse em seu texto que a métrica não funcionou, deu o mesmo arrasto do André Vianco, independente de qual argumento erudito use, ficou ruim! E isto já havia sido notado por Aristóteles. Não nego que um gênio possa fazer métrica funcionar na prosa, Virginia Woolf e Fitzgerald, tem enorme apreço a ritmos iâmbicos, comuns nas palavras curtas da língua inglesa, mas no seu caso você não foi este gênio, em seu texto a métrica tornou-se demérito, fazendo o mesmo arrasto chato dos textos dos manuais de redação e (falta de) estilo.

      Você quer usar as características comuns a todos os escritores medíocres para classificar seu modernismo, características de época e não do brilhantismo individual, assim como nós usamos internet, eles nunca usaram, e esta é uma característica da nossa época! Já expliquei mais de uma vez, que este historicismo só explica a mediocridade, e a tal intensidade de que tanto fala é puro preconceito, pois Cervantes, Rabelais, Victor Hugo, Melville, são intensos, até demais, se não consegue ver isso, não os leu. Não tiro minhas conclusões de autores que escrevem sobre escritores, vou à fonte primária, os textos originais, é por isso que digo, todo grande escritor foi moderno a seu tempo, e mesmo hoje são intensos! Tanto quanto qualquer outro grande escritor.

      Quando digo que a lógica permite ver o interior das estrelas, não é ironia, é fato! Paradigmática, como toda boa observação, podendo ser contestada e avançada tornando a visão do interior das estrelas menos embaçada e mais clara. Acho o Piza infantil, pois deixa-se cair nas primárias armadilhas relativistas, a jogada velha dos sofistas para ganhar um debate sem ter razão. E é esta razão que você tenta relativizar, há muito do que não conhecemos, o universo é grande, mas se ele nos mostra algo, é que a causalidade é que monta o que vemos, e ainda ela não foi violada, e o fruto prático desta causalidade é a razão, assim sem causalidade, não há realidade e não há razão: não pode ser visto, provado ou desaprovado, nem a dúvida é razão de sua existência ou inexistência. Como exemplo cito um dos grandes axiomas do sofismo, a flecha de Zenão, até hoje não permite solução, foi formulada para não ter, mas veja que o cálculo resolveu o problema insolúvel e hoje construímos pontes gigantescas e mandamos homens à lua, o problema de Zenão foi resolvido, mas sua proposição não tem solução, é ilógica em si, apenas um truque.

      Continua...

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    12. Continuando:

      Obviamente não é biólogo ou evolucionista, pois caso fosse veria que a tal racionalidade humana, é um conceito quase impossível nestas óticas, nem é possível distinguir um humano de um rato se vistos pela mecânica de seus corpos. A razão e a lógica ainda não foram diferenciadas no corpo humano. É uma questão de escolha para o humano, não para o animal, o humano pode ser um animal e não usar razão ou lógica, o animal não pode ser humano, não tem capacidade de razão e lógica que não seja entranhada na evolução comportamental carreada nos genes.

      Leio o Bloom como converso com uma amigo, e se calha de falarmos da mesma obra, consigo ver o que diz, não é questão de teoria científica, é fato, tem existência e lógica causal, o que ele aponta está na obra, simples assim. Contrário dos outros que falam coisas que não estão na obra por importarem conceitos de ordens angélicas criadas. Se quer falar sobre gênio deve definir bem o que entende pela palavra, assim como deus, o que é gênio e o que é deus? Se não há uma boa definição para começar a coisa fica ridícula. Deus é um homem de barba e veste branca? E gênio é um cara de pulôver de lã com cabelo desgrenhado e a língua de fora? Perguntas ruins tem respostas ruins.

      Ler “Ulysses” não é ser pedante, é apenas ler... assim como ler o “Heart of Darkness”, literatura é antes de mais nada experiência, não falo de carne de ornitorrinco se não provei o bicho, simples assim, e se “Ulysses” pode ser lido serializado, as “trevas” só se adensam ao final do livro, em um todo que perpassa a existência individual de cada parágrafo.

      Obviamente meu critério de cirurgia é muito mais restrito, e quando disse que fui grosseiro é porque acredito que o nível cirúrgico de olhar cada som, cada vírgula, cada significado, em conjunto ou isolado, só pode ser feito pelo autor, e se o fizer por ele, estarei intrometendo-me em texto que não me pertence. Mas é assim que leio, por isto lhe ofereci um único parágrafo para mostrar o óbvio, se ainda sobrevive magistral depois de tantas traduções é por ser o original impecável, pelo menos na lógica cirúrgica com que cada palavra foi escolhida para montar peça tão brilhante. Ser cirúrgico é olhar a escrita em seus mínimos detalhes; coisa que só o autor pode fazer. E isso é a habilidade mínima do bom escritor, ser cuidadoso com suas palavras, mestre proficiente na sua ordenação a ponto de dobrar a escrita em favor de sua estória.

      Literatura começa em ser um bom leitor, ver no texto as engrenagens que cada autor usou para construir sua máquina, como já disse o Robert Louis Stevenson em seu ensaio, nunca é bonito, mas fundamental para entender o funcionamento. E elas estão sempre ali, desnudas no texto para quem as consegue ver, não há como esconder nada em um texto. Assim, esqueça carenagens que cegam a visão e impedem de ver a máquina, esqueça prosa poética, modernismo, romantismo e romanesco, veja apenas o texto e sua máquina, se funciona ou não, e são os grandes engenheiros da máquina os grandes escritores, os que tem objetivo e propósito, pois sem eles nada se constrói que não seja obra do acaso, por isso o domínio do ofício, o laboro da escrita.

      Alex

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    13. Alex,

      Prezo sempre, em todo e qualquer diálogo, a cordialidade. Não consentimento sem crítica, apenas cordialidade. O que mais vejo em meu dia a dia são pessoas presas em suas individualidades e certezas que, por muito lógicas que pareçam, são pouco humanas. São equações — não seres — e mesquinhas.
      Por isso, é de causar apreensão a mim, que busco tão somente o diálogo sem me impor ou engedrar uma persona de erudito irredutível, o teor que se despreende agora desse diálogo (que tão benéfico me tem sido):
      Intervenções irônicas despropositadas, tachação, insinuações de pedantismo, tom peremptório nas afirmações, deturpações de significação...
      O problema não é haver discórdia, mas o tom em que ela se manifesta. De tudo quanto escrevi-lhe (antes da réplica acima), percebo que passou por alto de muitos argumentos meus (coisa de que me acusa!), limitando-se a reafirmar suas posições... E do pouco a que se refere, vejo com estranheza um pensamento que originalmente saiu de mim, mas que agora se me apresenta como uma figura grotesca (voltaremos a isso...)... "relativiza a razão", "Você quer usar as características comuns a todos os escritores medíocres para classificar seu modernismo","Ler “Ulysses” não é ser pedante, é apenas ler"... O que raios isso tudo quer dizer?
      Poderia ser como tantos outros e lhe dizer "leia direito o que eu escrevi", estive até a certo ponto de escrevê-lo... Mas vamos lá.
      1)Não relativizo nada, relativizar em benefício de quê? Se minha experiência de vida me faz não apoiar-me totalmente na razão, isso não quer dizer que relativizo. Você se interessou em me perguntar o que uso além da razão? Ou simplesmente pensou "o disparate"?
      2)Aqui, não posso criticar sua visão. Durante certo tempo da minha vida fui elitista. Só me interessavam os titânicos. Mas mudei. Leio literatura (não Sabrina et caterva). O problema de sua proposição é o elitismo (se me permiti pegar emprestado o seu tom emprestado). Acha que a única coisa que importa é a excelência... Literatura não vive só disso. Procure por esse blog e leia o que escrevi sobre A Moreninha... Seu autor é um produto da época, sua literatura nada me acrescenta de sublime, mas capto o espírito da época, aquela sociedade, seus costumes, o espírito de pessoas daquele tempo (o livro fez sucesso estrondoso... O que há no espírito desses leitores?). Em suma, tem um valor histórico. Calha às vezes de que a obra que se presta para o estudo histórico também seja de excelência (Odisseia e Ilíada); nada saberíamos do que se passou em certa época da Grécia sem essas obras. Não vivo só de estudar técnicas. Li o Alquimista... Coelho ali me pareceu mais do que eu esperava e menos do que o aceitável. Mas foi bom conhecer.
      Parece-lhe ridículo utilizar a literatura pra isso... Ok, é a sua visão.
      Acha mesmo que Romantismo, Renascentismo, Arcadismo são invenções a posteriore? Ou catalogações que só induzem ao medíocre? Para com isso... Goethe, Herder e outros se uniram em torno de um movimento originado de uma peça de Klinger. É fato. Para você é desprezível isso que os artistas fizeram? A Arcádia Ultramarina é uma ilusão? O grupinho do qual Bocage fazia parte?
      Escritores sempre se uniram em grupos, isso nada tem de censurável. O fato de terem características em comum os fazem medíocres? Quer dizer que se meu país está uma droga, e escrevo com o mais profundo pessimismo, porque tanto para mim quanto para meus contemporâneos não há outro tom, estou sendo medíocre?

      Continua...

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    14. Ler Ulisses... Esta é que mais me constrange, mas vamos... Primeiro (deixemos claro): não quero fazer um tratado sobre Conrad, nem sobre o livro citado nem sobre Lord Jim o qual estou olhando agora em minha biblioteca... Os poucos trechos que li pedantemente do Ulisses (li integralmente apenas Os Mortos), li-os com olhos de engenheiro. A cada minuto estou dissecando o novo que leio. O pouco que li de Ulisses mudou minha relação com a Expressão, o corpo no qual a estória foi parida. Cervantes, Stendhal, Flaubert, Henry James, Rabelais entre outros não me causaram igual impacto... E pronto. Não li ninguém outrora que escrevesse dezenas de páginas sem qualquer pontuação, nem com uma forma de narrar estruturada em torno de perguntas e respostas. Por favor, se conhecer algum que foi tão ousado, apresente-me (alguém além de Conrad, por favor...).
      Mas ler de forma fragmentária é pecado... Realmente, minhas costas são mais largas que as de Yeats e Shaw, que admitiram saltar várias páginas, e Yeats ainda escreveu elogios ao Irlandês... Mas ele pode, ele é Yeats, não é?...
      É melhor ler uma página bem lida que ler um livro todo contando as páginas para acabar. Este é meu adágio.
      Não é meu estilo desacreditar a leitura de ninguém... Retome nossa conversa em torno de O Tempo Redescoberto.

      Agora tachar é como está procedendo. Como pode dizer que li ou não li tal obra? Porque minhas conclusões não são as mesmas? Também não vou ficar paranóico se meu ponto de vista coincidir com o da academia... Em meus inícios de leitor pretencioso, chegava sozinho a uma ideia que cria tão genial e na verdade já tinha sido assinalada por um homem de pensamento. Não vou arrancar os cabelos da cabeça para ser original, "ir na fonte"... É tolice. Não me considero tão pleno enquanto ser e leitor para não conhecer o que os autores escrevem dos mestres. Se gosto, assino em baixo. Se não, eu descarto. Gostei do apontamento socio-marxista de Lukacs sobre o Fausto. Tem fundamento, encaixa, é seminal. Mas o mesmo considerava Tolstói uma excessão em seu plano de análise... Honestidade intelectual.
      Se não ficou claro, vamos lá: Não falo de obras que não li. Não vou fazer uma lista, seria muito extensa...

      Caro Alex, nossa conversa me é benéfica. Mas não sei se percebeu, ela não é um jogo de xadrez que propiciará ao vencendor um polpudo prêmio, ou status. Respeito-o, acho que nem preciso dizer. Agora, é necessário tirar melindres (dos dois lados) dela. Não fazem o menor sentido. Ponho minhas ideias nisso, não qualquer coisa que, se maculada, irá me ofender. Como creio que somos mais que os afetados da internet, que depois de um ponto divergente, vão para seus cantos particulares com cara emburrada, acredito que seguiremos, conhecendo e aprendendo com o outro.
      Minha vontade era falar mais sobre "razão", mas me extendi muito.
      Você se coloca como um socrático. Não passe por cima de alguns argumentos meus. "São disparates", você dirá. Sócrates, ao que li, não diria isso de alguém. Mas como herdeiro do método socrático (pelo que percebo mais da ironia), proceda comigo como ele procedeu com Agáton sobre o Amor... Desarticule meu enunciados, se achar que vale a pena, mostre-me pelos meus próprios vocábulos o oco de minhas preposições...

      No mais, as estimas de sempre
      D.

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    15. Daniel,

      Confesso que estou perdendo a paciência ao ver que toma as conclusões erradas sobre minhas palavras, e assim o diálogo volta a estaca zero. Dizer que leu tudo o que escrevi, e ainda assim, afirmar que prego a separação das formas(prosa e poesia) quando estou afirmando milhares de vezes que não acredito em formas, que estas já morreram uma centena de anos atrás, mesmo depois de usar citação fora de contexto, o que já me desagradou, repetir a dose, parece piada, falta de respeito, nem minha crença socrática sobrevive. Mais uma vez: Seu uso de métrica não funcionou! foi desastroso, deletério para o texto, a engrenagem não encaixou, não valorizou e ainda atrapalhou. O outro texto que postou como exemplo prioriza forma e deixa o conteúdo de lado, em prejuízo, tem som não tem conteúdo que o valha, foi escolha do autor, prioridade de forma, como a escolha dos poetas, mas os bons uniam ambos, e ainda mantinham a forma. Por isso poesia é tão difícil, por isso é tão vilipendiada e incompreendida, foge da média, medíocre.

      É justamente minha crença que Sócrates foi declarado o mais sábio, pois não negava-se ao debate que fez-me prosseguir, e se acha meus argumentos muito inflexíveis, é por sobreviverem a muitas contendas, os que perderam ficaram no caminho, adoto sem pudores os mais lógicos, os guerreiros que aqui desfilam já adentraram muitas arenas e somente os vitoriosos me acompanham, sejam eles meus guerreiros ou de outros, aceito o melhor argumento; como acredito que fez Sócrates, e por isso foi decretada sua morte, pela mediocracia dos perdedores. É o caminho da sapiência, da ciência, da razão, exclusiva dos seres humanos. Não se relativiza a favor de nada, é a tentativa desesperada de empate quando não se tem lógica. E não entenda isso como um belicismo verbal, mas uma forma saudável de procurar a verdade, desde os gregos. Tenho em meu círculo de amigos meus maiores desafiadores, é o que prezo, gente que não descansa na busca. É difícil para muita gente entender, preferem o compadrio, confortável, sonolento e seguro, mas acredito nos sabores fortes da vida.

      Se tem argumentos importantes que deixei de lado, reafirme-os; tem coisa que nem achei importante comentar e preferi ficar na linha do raciocínio. Se tem algo que não seja a lógica, diga você, como eu disse, não acredito nem no “many worlds”. Foi você que disse que não leu “Ulysses”, não eu, e se leu uma parte e gostou tanto, por que não leu tudo? Não entendo, se encontro algo que gosto leio tudo, até o bilhete do padeiro. Eu prezo com os livros sempre um encontro virgem, assim sou só eu e o livro a nos entendermos, sem alguém empurrando-me sua visão, sinto que assim tiro mais da experiência. Li livros antes de qualquer teoria literária, só os lia, independentes de data, movimento ou qualquer classificação, li o que caia em minha mão, só depois de muita leitura veio-me uma dúvida, eu lia coisas velhas ou estrangeiras, mas nada novo brasileiro, sempre achei péssimo; para resolver esta questão é que me enfurnei em livros de crítica, mas já tinha lido as obras, assim, tinha minha própria impressão de cada livro ou autor. Comecei a achar a visão historicista uma excrecência acadêmica, renascimento só foi batizado no século dezoito, em França, por isso o “Renaissance” em vez de “Rinascimento”. Ser medíocre é seguir a média, a maioria, um livro popular é medíocre, e estou falando aqui de literatura de excelência, atingida ou buscada, pois não me preocupo com quem se contenta com mediocridade, eu leio muito livro que só tem o intuito de divertir, e mesmo nestes procuro na estória, não na escrita, um traço de genialidade ou espirituosidade que me divirta, mas aqui estamos falando de escrita, não só de estória, por isso refiro-me aos grandes mestres da pena. Não falo de valor histórico, merda de dinossauro tem valor histórico; Coelho neto na época de Machado fazia muito mais sucesso. Quem é Coelho neto?

      Continua...

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    16. Continuando:

      “ O problema não é haver discórdia, mas o tom em que ela se manifesta.” Esta é uma frase sua, ela contém uma das falácias mais odiosas: a falácia de tom. Não vou me alongar, pois existe material na internet sobre o assunto: “Tone fallacy”. Se visse o “tom” que eu e meus amigos conversamos sairia correndo.Você que disse, ler “Ulysses” é pedantismo, e digo que é apenas ler, acho o medo irracional desta obra ridículo, ninguém é obrigado a saber milhares de referências que fazem parte do livro, aliás, acho até melhor não saber, para ler o que há lá, não é um bicho de sete cabeças, quase do tamanho do primeiro livro da trilogia de gelo e fogo, caiu no meu colo por erro, pedi um livro de James Joll e recebi um James Joyce, foi divertido, nem conhecia. Não quer ver pontuação, quer novidade? Leia Gertrude Stein!

      Não acho que esta conversa está levando a qualquer ganho, acha que há pontos que deixei de lado? formule-os novamente e diga por que são importantes, existe algo além de razão e lógica? Que possa ser útil? Diga! mas submeterei o argumento à lógica, é a própria raiz da escrita.

      Alex

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    17. Meu caro,

      As pessoas vem de nichos culturais diferentes, com relações diferentes e temperamentos diferentes. O problema que se estabelece logo quando se conhece uma pessoa é não saber quais suas inclinações e temperamento.
      A fim de evitar equívocos despropositados, acho que a melhor forma é expor simplesmente e objetivamente (o que acho que fiz até agora) o que penso, sem abordar seus pensamentos que "descontextualizo" e expô-los, os meus, ao seu escrutínio...
      Primeiro, começando do final: Sou mais lógico do que desconfio. E isso se dá principalmente pela estranheza que me toma (a qual você marotamente classificou de "falácia") ao ver duas pessoas conversando sobre questões abstratas ou não — mas que de qualquer maneira nada tem a ver com suas reputações ou coisas de igual natureza que, uma vez maculadas, ofendem — e vê-las aumentando gradativamente o tom de voz, "impacientando-se", chegando aos estertores... Não é falácia, simplesmente é o meu jeito. Acho melhor que o pensamento prevaleça por si, de preferência evitando construções com adjetivos (sobretudo para falar do pensamento de outrem). Discutir com adjetivos é fácil, como bem disse Millôr. Se eu e você estamos conversando sobre coisas que, bem consideradas, são exteriores a nós, que sentido faz esses termos: "a tal intensidade de que tanto fala é puro preconceito"? É mais fácil cortar algumas palavras e escrever: "sua visão é preconceituosa". Diga o que é preconceito para você, se quer ser bem interpretado.

      Se for comentar o que escrevi, por favor cole o trecho em que digo: "ler Ulisses é pedantismo". Se de fato escrevi isso, estou me transformando em um louco ensandecido... Que sentido há nessa frase?
      Respondendo sua pergunta: Sou honesto o suficiente para não ler integralmente um livro se ele é demais para mim. Isso não impede que eu o folhei. Tenho esse apego com o corpo do livro. É melhor ler bem uma frase que ler desleixadamente o livro todo. Esporadicamente retorno ao Em Busca do Tempo Perdido, preferindo O caminho de Swann e O tempo redescoberto, este último que me alimenta enquanto artista, porque como já disse LEIO UM LIVRO COM ESSE OLHAR TAMBÉM, O QUE ME FAZ PEGAR DE CARA O ESTILO DO ESCRITOR. LEIO E ME DEIXO INFLUENCIAR. Se produz literatura, vai entender o que eu disse.
      Não preciso ler Ulisses integralmente para mensurar seu tamanho, como bastam para mim poucas páginas de Viagem ao fim da noite, para captar a maestria de Celine em transformar o dramático em cômico, além de buscar um estilo mais prosaico abusando do sujeito pleonástico nas frases... Essas nomenclaturas lhe parece "clichês", conceitos pré-concebidos antes da leitura pura, certo? Não, meu caro: Não li o livro esperado desesperadamente encaixá-lo num aparato técnico. Não tacho as coisas.
      Entendi seu pensamento, inclusive sobre o tal "cirúrgico", mas tenho uma pergunta: se todo grande artista é cirúrgico no que faz, devo considerar que sua obra toda é cirúrgica? Que o Shakespeare de Titus Andronicus e Hamlet é igualmente cirúrgico?

      Sobre separação de formas, já compreendi. Inclusive, o que não me ficou claro é repetir sobre isso de novo logo em seu primeiro parágrafo... Quando usei (num comentário já agora antigo) sua análise sobre a minha e a obra de Wítalo, foi com o fito de argumentar que PARA QUESTÕES ESTÉTICAS, DE APRECIAÇÃO ESTÉTICA, A RAZÃO E A LÓGICA CLAUDICAM.

      Continua...

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    18. A fim de evitar a ideia errada, vou explicar: Não me interessa falar que minha obra é boa, você que não soube lê-la... O que quis dizer é que, SEGUNDO O QUE PENSO, a razão não dá conta desse campo: Apreciação estética. Sua leitura foi legítima (inclusive alterei trechos cedendo a seus argumentos), foi ponderada... Mas a razão, que tem sido o tópico de nossa conversa, poderia dar conta do fato de que a leitura empreendida pela Maurem viu no ritmo inicial "a confusão do medo e depois do ferimento" que "convencem"? Esqueça o mísero conto, concentre-se nisso: A razão é capaz de dar conta dessa nossa percepção do que é ou não "belo"? E de outros particulares? Independente se temos igual definição de Deus, ARRISCO DIZER QUE NUNCA LOGICAMENTE IREMOS PROVAR SUA EXISTÊNCIA.

      Se achou que busquei "empate", por conta do "relativizar", está enganado. Não vejo isso como uma competição, mas como um exercício válido de me ver às voltas com o pensamento de outrem e do meu mesmo.

      Crer que um alguém inicie com volumes de crítica literária sem ir antes na fonte é estranho... Comecei a ler de verdade na adolescência. Ninguém me disse "Gregório de Matos é um clássico, você deve lê-lo segundo essas diretrizes"... Inimaginável um adolescente começar a ler segundo esses parâmetros...
      Aliás, ainda bem que não leio dessa forma, senão estaria imbuído de muitas coisas ILÓGICAS afirmadas por Bloom... "Invoco Shakespeare, o verdadeiro mestre de Proust"; que lindo... Você que o leu e foi "direto na fonte", viu isso na obra do Francês também? Por que Shakespeare e não Flaubert ou Stendhal?

      Como disse ser paramentado contra essa falácia de tom, sinto-me mais relaxado para dizer que pode fazer uso da sua liberdade se achar que estamos rodando em círculos... Quando disse que me tem sido "benéfica" a conversa, estava pensando alto...

      Abraços,
      D.

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  15. 2. É claro que sob o prisma do olhar artístico todos temos uma visão diferenciada, mas se atentarmos bem calmamente, veremos que quanto a esses mestres citados acima, todos nós concordamos quanto a grandiosidade estética. Mas o que tornou- os diferenciados?- O que levou- os ao panteão eternizando- os?- Todos sabem que William Shakespeare arrebatou tanto a comedia quanto a tragédia. Que Tchekhov era um mestre na arte de contar enfim, que dizermos de” Crime e castigo”?- Que imortalizou Miguel de Cervantes e, por que imortalizou- o?- É claro que todo grande escritor é cirúrgico meu caro Ale, mas o que seria de “Os Lusíadas” se fosse apenas mais uma epopeia?- O que seria de tal obra se Luís de Camões não trabalhasse inúmeros temas como religião, história, mitologia, entre outros temas aliando- os à forma?- E o que falar de seus sonetos?- É claro que a arte envolve- nos com seus encantamentos precisos. Não estamos discutindo sobre Paulo Coelho e Jorge Amado, aliás se fosse por isso, talvez não valeria a pena. Os gênios surgem de onde menos se espera. Onde foi escrito "O Peregrino" de Jonh Bunyan, quem era o nosso maior simbolista?- Por que será que um escritor negro, pobre,gago, epiléptico se tornou o maior escritor brasileiro?- Por que será que Guimarães Rosa é tão respeitado pela critica?- Será que é unicamente pela forma?- Será que não houve nenhuma inovação, seja em seu tempo ou agora, na obra dos escritores os quais comungamos serem geniais?- Ah, matemos então Ricardo Reis, Alberto Caeros e Alvaro de Campos e então perguntemos: Quem é esse tal de Fernando Pessoa?- Não podemos menosprezar o velho, porém é necessário respeitar o novo de igual modo, pois não somente no que há velho como também no novo é preciso esperar algo mais, porque em arte sempre há algo mais e as lentes do artista se completam no olhar de um critico- analista. Quanto à prosa poética, prefiro tenho comigo minhas convicções, mas com o tempo, acredito, não estaremos discutindo sobre “pão ou pães,” talvez sejamos de escolas distintas, e imitando Machado, foco com Shakespeare quando diz que “há mais co!sas entre os céus e a terra que nossa vã filosofia”.

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    Respostas
    1. Eliezer,

      O novo depois de pronto já ficou velho, quem imortaliza um texto é sua excelência, sua resistência ao debate do tempo; sem crítica, sem debate, não há texto que possa ser provado imortal. Gênios vem de todas as partes, mas não são abençoados ou estrelados, trabalham duro para isso, e é o trabalho, o laboro no ofício de escrever que faz o grande escritor, não é a arte, pois o grande escritor pode ser compositor medíocre.

      Só o trabalho no ofício faz um bom escritor, ninguém é tocado com varinha de condão e torna-se por mágica um grande escritor, é preciso dominar a arte, polir a habilidade no uso das ferramentas, mestrar o ofício, e assim, por óbvio que pareça, todo grande escritor vai ser cirúrgico, mestre do uso da palavra, que obedece sua vontade, seu domínio, desta maneira a arte de escrever dobra-se diante do escritor.

      O novo e moderno pode ser aleatório, sem sentido, sem alma. E para isto é só fazer um texto na antiga receita dadaísta, recortando palavras e as tirando aleatoriamente de um saco, sem sombra de dúvida será novo; basta? Óbvio que não! Não é o novo, mas sim a intenção do autor, seu domínio “cirúrgico” da arte escrita que fará sua vontade, esta sim não aleatória, tomar forma, ato de criação, um texto com alma. É a vontade do autor que fará texto seu com vida, algo novo, algo que representa uma alma única; não é o novo, é o domínio para fazer seu, parido por este espírito único que caminha sobre a terra, mundano, em carne, osso, sangue e idéias.

      Abraço,
      Alex

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    2. Entedo seu argumento, Alex e prezo- o, pois apreendo em sua maneira de escrever grande maestria, mas é preciso criticizar "o novo depois de pronto já ficou velho", porque o diamante se revela ao lapidar- se. Aliás, vale- se muito esse argumento no tocante às ciência e mesmo informações jornalistica, no obstante referindo- se à arte, não podemos analisar de um lugar comum.Bem, no tocante ao dadaismo, prefiro me abster, pois convenhamos, É possivel discutir algo que já nasceu sem animosidade?- Por que desenterrarmos o que não floresceu?- Peço te que desconsire as informações referente ao daed(ismo), e voltemos ao nosso foco, vejamos: Jorge Luis Borges, um dos melhores escritores argentino se não o melhor, quando questionado, por um reporter, se lia todos os livros de sua biblioteca, respondeu- lhe:
      "Não, apenas releio alguns". Machado, séculos depois, relia, como se fosse uma oração, Shakespeare e, Freud,criador da psicanalise, assim como Goethe também o lia. Como dizer que Shakespeare tornou- se velho se, séculos depois, baseado na leitura deste, de Goethe e da fantastica tragédia "o rei Édipo entre outros," criou- se a psicanalise?- O que dizer então de Bakhtin, o qual desenvolveu estudos sobre enunciados, contribuindo para educação de maneira empirica, lendo Fiodor Dostoyevsk?
      Quantos as formas, é um direito seu optar por tal estilo, entretanto fico com Drummomd em: "mundo mundo, vasto mundo ..."

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    3. Eliezer,

      Só consigo fazer sentido em sua crítica se associa bom ao novo e ruim ao velho, tudo que existe já foi novo e ficou velho, tudo que existirá será novo, mas também ficará velho; desta maneira tudo sempre será novo e velho. Para o escritor o texto que recebeu o ponto final já é velho, para o cientista a pergunta resolvida já ficou velha no momento que acha a solução. O diamante e o metal ao deixar a mão do ourives, ganha nova forma, já velha. Jóia preciosa, velha como o tesouro dos faraós. Quem não envelhece é a excelência, é ela imortal, atravessando os tempos e resistindo ao novo.

      O dadaísmo foi uma crítica, uma mímica grosseira que expõe ao ridículo o culto acéfalo do novo, este que transforma a arte em mictórios. Crítica quase centenária que só é esquecida pelos que prezam na arte a hipocrisia e o novo sem excelência, o novo que como único predicado tem novidade; veja hoje a bienal de artes, não está lá o puro florescimento do dadaísmo? E pior, sem crítica, sem um pingo de excelência.

      Bahktin, assim como Aristóteles, é um sistemata, um classificador, criador de ordens angélicas, por mais mérito não deve ter o destino que deu a igreja ao Organon, pois nada de bom vem deste ordenamento.

      É direito de qualquer um optar por qualquer estilo, ter qualquer opinião, gosto ou estética, mas não é direito querer que sejam verbalizadas sem receber resposta, pois este é o cerne do debate e da discussão, os que não podem com críticas devem manter-se calados, pois do contrário o que querem é que suas opiniões, de pessoal passem a ditadura, quando não contestadas. "Mundo mundo, vasto mundo ..." Com excelência e mediocridade, maravilhas e abominações, sim, o mundo é vasto, mas de toda esta vastidão, não é tudo que quero no meu quintal, e menos ainda em meu texto.

      Abraço,
      Alex

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    4. Meu caro Alex, o fato de estarmos interagindo já é resultado de que temos algo em comum. Jamais, em meus argumentos deixaria de ousar contigo, é essa ousar que faz- nos melhor, porque nesse hábito, onde a retorica, arma de nossas contradições, eleva- nos à seres racionais. Digo racionais, porque entre os "imagens e semelhança" do Gênesis, sabemos que nem todos, de fato, fazem- se valer de tal realidade. Enfatizo suas habilidades e competências, porque, percebo, que nãos se apoia nem no passado nem mesmo no futuro. O tempo é pragmático e, exteriorizado, seja o que for, já faz parte de passado. o futuro é um tempo no qual se deleita apenas o Tempo. Todavia não haveria um interagir se não houvesse um primeiro passo, passo que, uniu- nos de uma maneira indireta, mas unindo- nos porque, embora de "escolas distintas" como sinalizei em nosso primeiro contato horizontal. É claro que as palavras que saem de nossas bocas, assim como nossas criações tornam- se reais e, consequentemente envelhecem aos poucos, também serão nossas obras, mas como seres humanos, um artista rebuscado terá sempre algo a oferecer e, por melhor que seja, no outro, terá sempre algo a despertar. Sei que cuida de seus quintal, tal qual jardineiro e, percebo a imensidão de seus muros, mas tenho certeza que a água que corre entre seus muros são bem encanadas, no obstante essas mesmas águas correm em torno de seu bairro e outros, e, ainda, passam por encanações distintas, embora os olhares mundanos não percebam- na. É claro que haverá sempre um vago onde a água escorra, é disso que consiste o nosso dialogo. Quanto a criticas, meu caro!- Também faz parte dessa intriga maravilhosa que batizamos por dialogo.

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    5. Eliezer,

      Espero ter deixado claro que o negócio não é o novo, mas o seu, que se seu como ser único, será novo, mas por conseqüência e não por causa. É necessária intenção, e esta não se materializa sem o devido domínio, conseguido na prática do ofício, no laboro, e sem proficiência o aleatório toma conta da autoria, como no poema dadaísta, sobra o novo, mas perde significado, alma, vida.

      O debate em bases lógicas e racionais, fortalece ou destrói o argumento, críticas que não se colocam à prova, são indignas de confiança, arte que não permite crítica é tão frágil que à mera brisa da discórdia, fica desnuda, expondo sua verdadeira forma grotesca.

      Lógica e razão são escolha, assim como a excelência, mas qual escolha é falsificar a excelência e fugir do debate? Viver é uma busca, à sua escolha, ou apenas a vida dos animais forrageando, por que querer ser animal que emula humano, quando se tem a capacidade de ser humano? São as questões que aparecem na literatura brasileira, falsificar o homem, ou viver em toda sua plenitude.

      Abraço,
      Alex

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  16. Nesse sentido o termo mais apropriado seria “originalidade” já que assim como a palavra “ignorância” o “novo” dá ênfase às múltiplas interpretações. Nesse sentido, “originalidade”, o sentido muda totalmente, pois cada leitor pode interpretar um texto de maneira diferente e, palavras isoladas pouco dizem, sendo assim, é necessário um contexto onde a expressão toma corpo e, com o corpo condições de mover- se.
    O substantivo “Ignorância”, por exemplo, utilizado de maneira separada, o que significa?
    Agora, vejamos isto em um contexto:
    A – O homem corrigiu ao filho com ignorância.
    B – O homem conhecia as regras, mas agiu com ignorância.
    C – A ignorância dos políticos honestos, no Brasil, é que eles assistem aos outros que roubam como se seus olhos fossem vendados.
    D – Ele nada sabia sobre o caso, por isso nada pôde fazer.
    Verificando os exemplos acima, constatamos que há ao menos 03 tipos de ignorância:
    1 – A ignorância relacionada ao ato agressivo referente “ao pai”.
    2 – A relacionada à falta de conhecimento de determinado tema, situação ou assunto.
    3 – E ato de “fazer pouco caso a uma situação que requer uma atitude pontual”.
    Bem, você pode até questionar: Por que você não utilizou o adjetivo “novo”?- Já trabalhamos isso em nosso interagir. Compreendi “mas o seu”, por isso utilizei “originalidade”.
    Quanto ao “novo” utilizado por mim, no texto sobre Guimarães Rosa, era referente à inovação linguística, introdução da prosa poética, a invenção no monologo no texto literário, a espiritualidade, a valorização da palavra, a multiplicidade, utilização de neologismo, valorização de palavras arcaicas, enfim, questões concernente ao homem, à terra, não em sentido superficial, mas global, elevando uma literatura árida e escassa a um campo espiritual e ampliando o sentido “Sertão, “O sertão está em toda parte,”” pois os problemas do homem não se limita apenas a um determinado espaço.
    Quanto ao termo “retórico”, em realidade utilizei- o, sim, mas poderia utilizar ou termo, pois na realidade poesia, “prosa poética, enfim, trabalhamos com o lúdico, ou melhor, brincamos com o lúdico, se permite utilizar tal pleonasmo”.
    É preciso criticisar, sim!- “Não critiquei de maneira direta o uso de formas métricas clássicas ou neoclássicas e a estrutura linear dos gregos, mas tenho que tomar muito cuidado, pois “formalidade” e “originalidade” são termos de origens distintas”.
    Aliás, Alex, concordo contigo quando diz que “Lógicas são escolhas,” mas lógica também é matemática e, nesse sentido “Que fazermos das formas métricas”?- Que dizermos de nosso ato discursivo?- Será que teria alguma graça se não houvesse “polissemia em nossos discursos, sendo eles apenas matemáticos e, enfim, baseado apenas na genealogia da arte Greco- romana e, enfim”. De nosso “príncipe poeta” parnasianista?
    Com relação à literatura, seja ela brasileira, russa, alemã, francesa ou mesmo a inglesa em sentido amplo, será que temos tantos escritores originais assim?
    E, mesmo os mais originais, jamais desprezaram seus antecessores. Com relação à literatura brasileira, a qual tu dá ênfase em seu texto, se faz necessário compreender que “escritores por excelência” é algo muito raro, assim podemos descrever alguns poucos, todavia, não pretendo discorrer, pois acredito que não aja tal necessidade.

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    1. Eliezer,

      Originalidade... pensei um pouco, quase me convence, mas refletindo no assunto encontrei alguns problemas; em literatura quase tudo é original, e se cópia literal plágio; Bach seria original ante Corelli? E mestre Leonardo? Nada original, apenas melhor, sublime, fazia o que todos faziam, retratos, com superior habilidade, foi original? Pouquíssimo, mas folgo dizer que da intenção, da ideia pouco original de um retrato tirou o máximo. Originalidade per si pode ser apenas um conjunto de parangolés trejeitosos, sem representar mais. Há nos grandes trabalhos uma intenção, uma visão, lucidez que é peculiar de apenas uma cabeça, e assim, insisto no seu, não no novo, nem no original, apenas seu, que se seu como ser único será novo, original, seu, mas é preciso o laboro, o domínio do ofício, para habilidade ser capaz de dar forma à existência, a melhor forma, sublime.

      Lógica permeia a matemática, mas não é lógica, é uma linguagem, como as letras, é possível ter matemática ilógica, e se pensar bem há na matemática pressupostos não provados como a infinita divisibilidade, o que a torna apenas um meio de expressão como a linguagem diária. Lógica é uma escolha, a causalidade à nossa volta.

      Há poucos mestres escritores, mas sua escassa existência não invalida a busca, diria exatamente o contrário, procurar a excelência em vez de aceitar a mediocridade, promove-la em vez de evitar o debate critico, visa à mistura e a confusão que não permite o florescimento da busca honesta, o trabalho e o domínio do ofício.

      Abraço,
      Alex

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  17. Fico feliz por levá- lo a refletir e, reconheço que os artistas em geral, dão aos quadros sua nova feição. Assim produzimos inúmeros pintores cada um com suas particularidades. Mas faz- se necessário, ainda que não aceitemos, algumas particularidades as quais encaixam- se como modelo, ou mesmo, um retrato. Mas, assim como o mestre de “O retrato Oval”, de Edgar Alan Poe é preciso que haja vida, por que no calor do ofício, no enfervercimento da paixão é necessário esvair- se para que se sobre, no todo, apenas a obra.
    O retrato de fato, quadrado ou oval, continua um retrato como todos os retratos, porém não podemos nos prender a moldura de uma obra de arte.
    Sabemos que mestre Leonardo envolveu- nos porque há algo mais, aquilo que levá- nos à reflexão assim como no “Dom Casmurro” pincelado por Mestre Machado.
    Já dizia Abelardo Barbosa que “na vida nada se cria tudo se copia” e, de alguma forma, há alguma realidade nesse argumento, no obstante ao olhar do crítico analista as formas perdem o contorno e ganha novos significados.
    Por melhor que seja um artista é possível que, talvez nem ele, saiba a grandiosidade de sua obra, aliás, é possível que não saiba por mais que, a rigor, tenha domínio sobre o seu próprio saber.
    Claro que “intenção, visão e lucidez” são partes constituintes de genioso escritor, mas até onde temos conhecimento das múltiplas possibilidades de nossas obras?
    Só a crítica, seja ela direta ou indireta, por meio do tempo, pode desdobrar realidades sobre grandíloquas obras. No obstante abstenho- me, por hora, dessa sensata discurssabilidade e convido- o para uma leitura de um simples conto:

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  18. O dilema de Demóstenes


    eliezer-nascimento.zip.net/

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